Publicado originalmente em:
http://www.palavraoperaria.org/Virginia-Guitzel-fala-sobre-a-defesa-da-trabalhadora-trans-em-fabrica-ocupada-por-trabalhadores-na-Argentina-Madigraf-Donnelley-transexual
Essa semana o IzquierdaDiário, diário digital impulsionado
pelo Partido dos Trabalhadores Socialistas na Argentina, publicou uma entrevista
com Nando, trabalhador da Madygraf (ex-Donnaley), uma gráfica que
passou a ser controlada pelos trabalhadores sem os patrões após a tentativa de
fechamento da mesma. Nesta entrevista ele relatava a defesa firme que os
trabalhadores fizeram de uma companheira trans e das grandes discussões que
tiveram no interior da fábrica sobre o tema.
Virgínia Guitzel,
trabalhadora travesti na área de saúde mental do ABC Paulista, comentou: "O lema que carregam os trabalhadores de
Madygraf ’Mexeu com um, mexeu com todos’ é uma concepção que não apenas fortalece
os trabalhadores em sua unidade contra os patrões e o governo, como também
garante que os próprios trabalhadores possam exercer sua sexualidade e
identidade de gênero".
Continuou: "Os
trabalhadores e as trabalhadoras, assim como a juventude negra e pobre, são os
que mais sentem o peso da repressão sexual assegurada pelos governos em pacto
com as grandes instituições religiosas. Essa experiência é um grande exemplo
pois descobre uma verdadeira maneira de garantir na vida real, coisa que a lei
mais avançada de identidade de gênero como na Argentina não poderia garantir: o
respeito e à permanência no trabalho. Enquanto uma pequena parcela das
travestis seguem com a vida dupla para garantir seus empregos quase sempre
precarizados, a grande maioria segue relegada à ideia naturalizada da
prostituição compulsória".
Em comparação com a vitoriosa greve da Universidade de São
Paulo, Virgínia complementou: "Para
nós, travestis e transexuais que estamos completamente invisíveis, a valente
presença das mulheres trabalhadores da USP na linha de frente da greve que
durou mais de 100 dias fortalece a voz feminina que grita contra nossa
opressão. Essa marcante presença já me fortalecia. Mas foi a atitude do Comando
de Greve de votar a delegação de 8 companheiros a participarem do ato por
justiça à João Donati, jovem homossexual brutalmente assassinado, que recuperou
uma das maiores subversões. Os trabalhadores tomando em suas mãos as demandas
dos setores mais oprimidos. Depois, o debate organizado pela Secretária de Mulheres
da USP sobre "Machismo, homofobia e transfobia" foi fundamental para
dialogar com diversos companheiros que não entendiam ao certo o que sentimos e
os assassinatos, agressões e mutilações que sofremos. Ali, diferentemente do
que é de costume no sindicalismo brasileiro, se fortalecia uma relação profunda
sobre a vida e a opressão que atinge setores amplos da população. Tanto para
fortalecer a unidade contra a ideologia dominante como para criar uma relação
mais profunda entre os próprios trabalhadores, extrapolando as barreiras da
separação entre a vida e o trabalho".
Sobre as afirmações do trabalhador Nando sobre a relação
entre o movimento LGBT e o movimento operário Virgínia concluiu: "Concordo inteiramente com a visão de que
somos todos e todas trabalhadores lutando pela construção de uma nova
sociedade. Esse exemplo concreto da defesa intransigente da identidade gênero
da trabalhadora trans a abre a perspectiva que, hoje, o movimento LGBT, que
abandonou o horizonte da emancipação sexual das massas populares, limitando-se
a reivindicar a "ampliação de cidadania" para os citados na sigla,
possa se reencontrar com as lutas operárias para golpear nossos mesmos inimigos
com um punho só. Esse potencial revolucionário de encarar de maneira
consequente o combate às opressões recupera as experiências mais avançadas da
história da classe operária e das grandes transformações sociais. No Brasil,
conhecido como país mais homofóbico do mundo, estes exemplos são as expressões
concretas que justificam a esperança que tenho na humanidade e na construção de
um mundo verdadeiramente livre, onde possamos ser quem somos e ter as condições
de decidir e construir não apenas nossa sexualidade ou identidade individual,
mas construir um novo ser humano a partir da organização social sem classes,
sem Estado e sem qualquer tipo de exploração ou opressões".
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