quarta-feira, 9 de julho de 2014

Pão e Rosas e Juventude ÀS RUAS no Encontro LGBT DA USP

Veja nossas intervenções no Encontro LGBT da USP:

Virgínia Guitzel, ABC Paulista


 

 Adriano Favarin, São Paulo


 


 Tatiana Cozzarelli, Rio de Janeiro

 

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Suplemento Especial LGBT (parte 2) - AVANÇOS E CONTRADIÇÕES NA LUTA PELA EMANCIPAÇÃO DE NOSSA SEXUALIDADE


A partir do estourar da crise mundial em 2008, temos presenciado cada vez maiores embates entre um ou outro direito obtido pelxs homo e TRANS* e a virulência com a qual os setores mais reacionários da sociedade respondem. Essa situação tem evidenciado o engodo propagado por vários anos de que a nossa emancipação se daria pela via de conquistas progressivas e acumulativas de direitos com a “ampliação da cidadania” dentro dos marcos do atual Estado capitalista. O aumento dos índices de assassinatos de homo e TRANS*, a situação de vida miserável na qual são lançadxs xs LGBT e as mobilizações de massas organizadas pelas Igrejas e políticos conservadores contra projetos de legalização do matrimônio igualitário escancaram que, dentro desse sistema social, econômico e político, os pequenos direitos conquistados estarão sujeitos aos cortes e ajustes que os governos e instituições financeiras internacionais imponham como também aos vai-e-vens das relações de forças sociais. O governo Dilma, do PT, já não consegue mais esconder que por trás de discursos supostamente “progressistas” se encobrem compromissos com setores direitistas e concessões às bancadas moralistas que visam reforçar o controle social à custa da retirada de liberdades democráticas.

Para compreendermos as tarefas atuais que o movimento LGBT deve se dar é necessário retomarmos os processos de luta que o movimento passou nos últimos anos desde o seu início e as mudanças sociais, estruturais e conjunturais que influenciaram e colocaram à prova as estratégias do próprio movimento, apontando os avanços que elas tiveram na luta contra a ditadura, dentro do Estado democrático, contra a moral burguesa, assim como também os seus limites e discutirmos as origens do ceticismo com a transformação radical da sociedade que hoje percorre o movimento LGBT.








A primavera do movimento sexual.

Anos 60 e 70, os primórdios da luta pela libertação sexual.
 
Encontrando-se nos limites do crescimento econômico parcial proporcionado pelo fim da Segunda Guerra Mundial e desiludida com as perspectivas de futuro em um mundo polarizado entre um capitalismo que não apresentava qualquer nova esperança e um socialismo degenerado pelo stalinismo em uma ditadura burocrática contra xs trabalhadorxs e setores oprimidos, a juventude se radicaliza internacionalmente nos finais da década de 60 e toma as ruas contra a crise econômica, contra a guerra do Vietnã, contra o arrocho de vida, contra a moral e os costumes conservadores e contra a ordem social e cultural vigente.

Em várias partes do mundo essa explosão de indignação e questionamento da juventude se liga com as demandas econômicas e políticas da classe operária e da maioria da população, originando ascensos revolucionários de massas. Esse processo invade a vida privada e revira as roupas de cama, mesa e banho da família nuclear burguesa, entorna os vinhos e champanhes no chão da sala de jantar e enfia as mãos até os cotovelos nos cestos de peças íntimas retirando, fétidas, peça por peça de toda a moral cristã apodrecida e de sexualidade conservadora e miserável da família tradicional.


É nesse contexto que o movimento pela libertação sexual sai do “armário” imposto pela repressão, irrompendo na cena mundial com as barricadas de Stonewall e a visibilidade “orgulhosa”. Entre a defesa intransigente das travestis, trans e homossexuais do espaço do bar Stonewall contra as violentas e cotidianas batidas policiais e as passeatas e organização em torno da afirmação identitária e sexual sobre ser “gay” e “lésbica”, xs homo e TRANS* travavam um combate à família tradicional, ao par heterossexual monogâmico e a todas as relações intersubjetivas que eles engendravam, marchando em defesa do amor livre e da vida comunitária. Colocavam a luta pela livre expressão da sexualidade como parte da luta em defesa do direito à mente e ao corpo, pela defesa do direito à maternidade e ao aborto.

Compreendiam a família tradicional como uma reprodução em menor escala do Estado capitalista, fonte da educação e reprodução dos valores da sociedade patriarcal e normativa, combatiam na linha-de-frente a miséria sexual que assolava a humanidade de conjunto e por isso mesmo faziam de sua luta uma luta política contra as bases do sistema capitalista. A luta pela liberdade social era vista dentro do movimento pela libertação sexual como condição primordial para a conquista dessa libertação. Nessa perspectiva xs homo e TRANS* se organizavam para combater tanto a ordem capitalista quanto o controle férreo da burocracia stalinista nos Estados Operários.

Em 28 de junho de 1969, em Nova York, no bar StonewallInn, xs homo e TRANS* afro-americanos e porto-riquenhos resistiram às investidas repressoras da polícia se organizando para defender seu espaço e em 1970 a organização "Frente de Liberação Gay (GFL)" surgida nesse processo participava da Convenção Revolucionária organizada pelos Panteras Negras. Antes, em 1º de novembro de 1968, durante a ditadura militar na Argentina, surgia no subúrbio operário de Buenos Aires o primeiro grupo político-sexual da América Latina, “Nuestro Mundo”. Dirigido por um sindicalista comunista expulso do PC por ser homossexual, este grupo atuou na clandestinidade até se fundir com outros grupos em 1971 na “Frente de Liberación Homosexual (FLH)” lançando o Manifesto “Sexo y Revolución”. Na sequência dos processos que em maio de 1968 sacudiram a França, no qual xs estudantes universitárixs foram até as fábricas se ligar com xs operárixs em greve para paralisar o país, surgiria a "Frente Homossexual de Ação Revolucionária (FHAR)", com o objetivo de organizar xs trabalhadorxs e xs homo e TRANS* para uma revolução política, social e sexual. Em 1º e maio de 1971, no Dia do Trabalhador, a FHAR desfilava ao lado dx soperárixs com uma faixa “Abaixo a ditadura dos normais!” e buscava se ligar com as organizações partidárias da extrema-esquerda, como as trotskystas, na perspectiva da revolução:

“Para nós, a luta de classes passa também pelo corpo. O que significa que nossa recusa em suportar a ditadura da burguesia está libertando o corpo dessa prisão, que durante 2 mil anos de repressão sexual, de trabalho alienado e de opressão econômica foi sistematicamente fechado. Então, não existe nenhuma possibilidade de separar nossa luta sexual e nosso combate cotidiano pela realização de nossos desejos, de nossa luta anticapitalista, de nossa luta por uma sociedade sem classes, sem mestre, nem escravo.”


Dezesseis grupos de dez países irão formar a Internacional Homossexual Revolucionária (IHR). Pela primeira vez na história, o questionamento da repressão sexual buscava a superação da sociedade do capital, se ligando com a classe operária em uma perspectiva revolucionária e internacional.


O outono do movimento sexual.

Anos 80 e 90, os primórdios do neoliberalismo, da cooptação e da restauração burguesa.

As organizações criadas pela classe operária, como os partidos social-democratas e comunistas, e até mesmo os sindicatos e os Estados Operários burocratizados, porém, não impulsionaram esse processo convulsivo de greves selvagens e intensos debates no meio revolucionário sobre amor-livre e combate a todas as formas de opressão. Pelo contrário, atuaram como freios do ascenso revolucionário de massas e como agentes da implementação das medidas que reconfigurariam pelos próximos 30 anos o domínio capitalista pela via da fragmentação dxs trabalhadorxs com o neoliberalismo. Essa situação desmoralizou politicamente das massas à vanguarda e endossou um ceticismo profundo sobre a possibilidade da transformação social pela via da organização e direção revolucionária da classe trabalhadora. A desorientação e fragmentação anterior da esquerda revolucionária com o fim da Segunda Guerra Mundial impediu que uma direção consequente canalizasse todo esse rico processo dos anos 60 e 70 e a classe dominante conseguiu se sustentar pela via do avanço sobre os Estados operários burocratizados pelo stalinismo, por meio do crescimento das formas de regime democrático capitalista incluindo a participação da classe média e de setores privilegiados da classe operária e envolvendo os movimentos sociais e subversivos da moral e dos costumes sob a tutela e institucionalização do Estado.

Exatamente assim se procedeu com o subversivo movimento pela libertação sexual. A incorporação de algumas demandas de igualdade sexual na pauta de políticas públicas do Estado visando à cidadania cooptou uma parte significativa dxs homo e TRANS* da pequena-burguesia que tiveram a porta aberta ao consumismo, ainda que em guetos voltados para sua orientação sexual “dissonante”. A consolidação de um mercado gay e a exaltação do indivíduo tendo sua realização no consumo firmaram as bases do “pinkmoney” e permitiu que a classe dominante quebrasse ao meio o movimento pela libertação sexual. Enquanto isso, os setores homo e TRANS* da classe trabalhadora padeciam na marginalização, no aumento dos índices de desemprego, na proliferação da pobreza, da violência policial, no aumento da exploração nos postos de trabalhos precarizados, na prostituição e na degradação social e também, sexual, a partir da restrição de sua satisfação e práticas sexuais ao esconderijo, sujeito a ambientes insalubres, perigosos e anti-higiênicos.

O divórcio da classe operária, encabeçado pelas suas direções, com os movimentos sociais se consumou e o movimento homo e TRANS* abandonou a luta contra a ordem social e moral que o capitalismo impõe e se contentou em pressionar as instituições do Estado por um “aumento de cidadania”. A classe dominante pôde então avançar ainda mais contra os setores oprimidos, ao ponto da primeira política pública do Estado aplicada axs LGBT ter vindo diretamente da pasta de saúde pública com a ofensiva da epidemia da AIDS. O extermínio de milhares de homo e TRANS*, o isolamento, o medo, a estigmatização e a patologização da prática homoafetiva submeteu o movimento LGBT ainda mais de joelhos perante um Estado que, pautado pela opinião pública por ele mesmo edificada, marginalizava xs homo e TRANS* como problema de saúde pública. Nesse período difícil para xs LGBT's, o refúgio nas ONG’s e nas mendicações ao Estado aprofundou ainda mais a institucionalização do movimento e sedimentou as bases da estratégia que viria a pautar o movimento LGBT a partir de então: a busca de direitos e do “aumento da cidadania” a partir de políticas públicas e da pressão por dentro das secretarias e comissões do Estado e dos lobbys parlamentares.


Por uma saída revolucionária para nossa sexualidade!

A revolução, ainda hoje, é uma condição fundamental para nossa emancipação.


Os longos anos de neoliberalismo aprofundaram um distensionamento na busca por uma estratégia capaz de alcançar a emancipação de nossa sexualidade. O que ficou conhecido como “grau zero de estratégia” nos anos reacionários, onde se restauraram o capitalismo nos ex-estados operários e se construiu uma forte ideia de triunfo do capitalismo, “fim da história” e “fim da classe trabalhadora”, foi responsável pelas diversas analises que hoje fundamentam o movimento LGBT/Queer.

Essa derrota objetiva, ligado ao fato do marxismo clássico e dos marxistas revolucionários que o sucederam não terem desenvolvido nenhuma tese ou contribuição à libertação sexual, com foco na opressão sofrida pelos LGBT, abriram o caminho para a construção de uma estratégia de emancipação pelos setores reformistas ou pós-modernos, sem lançar luz a partir das ferramentas do marxismo, no sentido da emancipação revolucionária de toda forma de sexualidade e identidade de gênero. O stalinismo, de forma mais completa, traiu a luta dos setores oprimidos e garantiu uma ampla influência em diversos partidos comunistas do mundo de invisibilizar e não oferecer nenhuma alternativa para os que mais sofrem com a sexualidade não-heterossexual e as identidades TRANS*. A identificação errônea do stalinismo com o socialismo foi a grande responsável pelo abandono dessas ferramentas pelxsLGBT's. 

A cisão dos movimentos sociais com a luta dos trabalhadores costurada nesses anos que chamamos de restauração burguesa garantiu o surgimento de uma tendência dentro do movimento LGBT que tem grandes pensadores que a representam, sendo ainda hoje muito referenciados: Foucault e Judith Butler, como principais símbolos.



A teoria Queer e toda uma “onda” do trans-feminismo hoje se pautam pela visibilidade (luta por ganhar espaços midiáticos e impor um reconhecimento social) e pelo idealismo, que retorna a Hegel, Austin e outros teóricos, para afirmar que “a linguagem determina a vida” e a ideia de “poder da fala”. Se por um lado há que se reconhecer como um progresso a visão difundida de que a construção da identidade de gênero e da sexualidade são frutos da sociedade em que vivemos, por outro, esta alternativa descolada da materialidade e das relações sociais nos parece um grande retrocesso estratégico na luta por nossa emancipação. Isto é, nossa assimilação do que somos, nossa construção individual, não pode se desligar das condições materiais que partimos para construí-las, da sociedade de classes, das variadas combinações de opressões e da ordem heteronormativa, binária e transfóbica a que somos bombardeados. Isso não deve nos levar a lógica de que somente os LGBT são oprimidos por sua sexualidade e identidade de gênero, mas sim que toda repressão sexual é fruto de uma necessidade objetiva do capitalismo de dominar nossos corpos e mentes para avançar na sua exploração, isso pode ser identificado na sexualidade reprodutiva que a maioria dos trabalhadores possuem, de maneira compulsória, sem ter conhecimento sobre o próprio corpo, deixando para as mulheres trabalhadoras a responsabilidade materna, sem a permissão de sentir prazer e construir sua identidade livremente.



Se, por um lado, a teoria Queer combate a reacionária visão de determinismo biológico (onde muitos LGBT se apoiaram num combate defensivo a ideologia da AIDS como “doença gay”), onde a biologia determinaria 100% nossa sexualidade e nosso gênero (impossível de ser re-construído) – o que serve de base para visões conservadoras e religiosas de patologização das identidades TRANS* e da sexualidade não normativa (sem fins reprodutivos), por outro, joga xs LGBT numa deriva estratégica, que em última instancia deposita no Estado ilusões de reformas progressistas, em geral pela via da reeducação da qual o pós-modernismo se debruça a construir a partir de uma contra-cultura.

Ainda que reconheça a sociedade capitalista, o pós-modernismo em suas mais variadas correntes de pensamento, não analisa os pilares do sistema capitalista buscando destruí-los para erguer uma sociedade comunista, onde sejamos verdadeiramente livres e possamos desconstruir e construir livremente nossas expressões e identidades. Por isso, para além da produção teórica – que sem dúvida cumpre um papel chave de combate a ideologia dominante que segue vigente nas universidades burguesas produtoras das mais variadas opressões - a revolução ainda segue como condição fundamental para nossa emancipação. A Revolução Russa – sobre a qual nos apoiamos –, que em 1918 já garantia a liberdade sexual (legalizando a homossexualidade), demonstra que mesmo as democracias capitalistas mais avançadas de hoje, ainda não podem garantir sequer o fim das padronizações para não se desvincular do “mercado rosa” (Pink Money), um nicho de mercado voltado ao público LGBT pequeno burgues ou diretamente burgues, que mantém "até onde se tolera" xs LGBT nos marcos do regime. O mercado rosa é uma das variadas formas de "inclusão" que amplos setores reivindicavam como medida progressiva de inclusão social dxs LGBT, que, no entanto, só expressa como apenas uma pequena parcela pode ser incluída, determinada novamente pelo caráter de classe.

É também lição da revolução russa, de que a transformação das bases econômicas não garantirá de imediato a nossa emancipação. Todavia, a revolução segue como condição para libertar todos os países da lógica capitalista de consumo, propriedade e de reprodução da família como regra, para permitir que revolução avance em todos os níveis, que destrua os pilares que perpetuam o machismo, o racismo e a homo-lesbo-transfobia. Sendo o capitalismo herdeiro último da sociedade patriarcal dividida em classes, é necessário defender fortemente a sua destruição internacional para que permita erguer-se uma nova sociedade baseada na relação de produtorxs e reprodutorxs livres, o que só é possível com uma política internacionalista também no âmbito da sexualidade.



Suplemento Especial LGBT (parte 1) - O FALSO PROGRESSISMO DO PT E AS MOBILIZAÇÕES DE JUNHO

A necessidade de uma estratégia revolucionária para 
nossa emancipação.

“É um fato curioso que, a cada grande movimento revolucionário,
vem à tona a questão do ‘amor livre’.” (F. Engels, 1883)



Se resgatarmos o período da última eleição presidencial até junho de 2013 vamos perceber que o horizonte para xs homo e TRANS* ficava mais sombrio a cada dia que passava. A partir do compromisso firmado entre Dilma e a bancada religiosa, vimos primeiramente a pauta da legalização do aborto e do direito a maternidade ser simplesmente rasgada pelo PT; depois as cartilhas educacionais e de saúde voltadas para explicar sobre a sexualidade e as DST’s foram banidas; o acordo Brasil-Vaticano vigorava e na medida que o ensino religioso nas escolas se ampliava, se ampliava também o número de homossexuais assassinados no país (de 2003 à 2007, aumentou-se 117% de assassinatos a LGBT – dos registros oficiais); e na coroação dessa ofensiva, o PT fechava acordo com o Partido Social Cristão que colocaria Marco Feliciano, pastor declaradamente homofóbico e racista, na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados.

Porém, em junho de 2013 vimos tudo isso mudar. A partir da mobilização de massas da juventude foi possível barrar o projeto de cura-gay e do Estatuto do Nascituro apresentado pelos setores conservadores na Câmara, após junho os questionamentos e alvoroços sobre a aprovação da união estável entre homossexuais, de súbito, silenciaram. A luta nas ruas e a atuação coletiva das massas de juventude freou o avanço que os setores mais conservadores da sociedade, benzidos e abençoados pelo governo do PT, estavam impondo sobre a vida e os direitos dxs LGBT. Essa conquista conjuntural nos fez extrair a lição de que a estratégia individualista de simplesmente nos construirmos como somos por fora de atuar coletiva e politicamente pelos nossos direitos não serve. Permite também confrontarmos esta lição com a experiência histórica que xs homo e TRANS* se propuseram na década de 70, de encabeçar a linha de frente da luta pela libertação sexual de toda a humanidade sempre buscando ter consigo o apoio e a participação da maioria dos setores da sociedade, em especial xs trabalhadorxs.

A ausência dxs trabalhadorxs como sujeito político e a debilidade dos sindicatos e das entidades estudantis de organizarem a juventude e tomarem em suas mãos as bandeiras dxs LGBT nas manifestações de Junho foi o seu principal limite. Isto fez com que, mesmo com as derrotas que o movimento impôs à pauta dos conservadores, Marco Feliciano permanecesse até o final do seu mandato na presidência da CDHM. 

Esse limite, porém, tem uma superação sem precedentes apontada em fevereiro de 2014, quando xs bravxs garis do Rio de Janeiro decidem interromper o Carnaval carioca como nenhum setor social poderia sonhar em fazer para exigir a valorização do salário. E sem se dobrar perante as ameaças do prefeito, do patrão, do juiz, da polícia e nem da burocracia sindical conseguem impor uma fragorosa derrota à classe dominante e um exemplo para xs trabalhadorxs e oprimidxs! Somente imagine a moralização para xs trabalhadorxs, e o choque educativo contra a ideologia dominante homofóbica e machista que não haveria, se um grupo organizado de homo e TRANS* se colocassem ativamente a apoiar e prestar solidariedade a esta luta? Imagine os frutos que essa aliança não traria também na luta pelas pautas dsx LGBT, ao terem suas bandeiras levantadas pelxs garis com os métodos operários de piquetes e paralisações? “Não tem arrego” nem para Feliciano nem para Bolsonaro!


Essa, a estratégia revolucionária, baseada nas mobilizações coletivas de massas, na organização dos setores oprimidos em aliança com xs trabalhadorxs e na hegemonia dos métodos e da centralidade da classe operária, é a única que pode responder contra a homofobia e na conquista, inclusive, dos mínimos direitos formais hoje negados pelo Estado capitalista e sujeitos ao jogo das forças sociais, aos acordos político-parlamentares e, pelos vai-e-vens da economia, ao sabor e gosto do FMI e do Banco Mundial. A garantia do fim da homofobia vai muito além da existência de uma lei. Como bem sabemos, com oito anos de existência, a Lei Maria da Penha não conseguiu reduzir mais do que 5% dos casos de feminicídio e nem dize sobre a violência contra a mulher. Também a criminalização do racismo até hoje não puniu ninguém por este crime – e não nos faltam exemplos de racismo, inclusive amplamente divulgados pela mídia e cometidos por figuras públicas, que podemos citar!

Dirigir o movimento, como fazem as correntes LGBT ligadas ao PSOL, com o norte na luta pela aprovação de leis (PLC’s) por esse Estado capitalista através da pressão pela via dos seus lobbys parlamentares, como Jean Wyllys e outros, só serve para fortalecer um Estado regulador e não combater o problema social. Ao mesmo tempo em que existe pouco ou nenhum investimento em tudo o que possa transformar a pobreza, a dependência e a precarização das mulheres, existem inúmeras leis penais para protegê-las, mas que não garantem igualdade na vida. Fazer deste o norte estratégico de luta dxs homo e TRANS*, como defendem xs reformistas do PSOL, significa depositar no Estado capitalista todas as fichas para nossa emancipação, sem nenhuma ação efetiva rumo a sua destruição. 

Também a estratégia de pressão por via de atos de rua para exigir dos governos a aprovação de leis, como propõe o PSTU, termina servindo aos mesmos interesses, pois novamente não deposita energias na construção de um serio plano de lutas organizado desde a base, pelo contrário, atuam por fora dos sindicatos e entidades estudantis que dirigem desperdiçando o importante papel de reconstruir a ponte entre as demandas dos setores oprimidos e a luta dos trabalhadores. A única maneira em que a luta pela criminalização da homofobia pode servir para organizar xs homo e TRANS* na luta contra o Estado é se a esquerda superar a estratégia “antineoliberal” e adotar uma estratégia verdadeiramente revolucionária, que parta de reconstruir a ligação, destroçada pelo neoliberalismo, entre os movimentos sociais e o movimento operário, sendo somente por meio dos métodos dos trabalhadores a única possibilidade de alcançar as demandas dos setores oprimidos, levantando bandeiras que se enfrentam não apenas com a moral burguesa, mas com a estrutura do capitalismo que a mantém.





De Milk à Jean Wyllys: 

a incapacidade do reformismo para responder nossas reivindicações

Centenas de LGBT hoje se veem representados pelo deputado Jean Wyllys (PSOL), pelo seu combate as bancadas religiosas que tentam repetidamente retroceder nos direitos conquistados pelos setores oprimidos. A ilusão que Jean Wyllys cria no poder do Estado em defender os setores oprimidos é parte de sua estratégia de garantir direitos acumulativos a partir de projetos de lei, mas sem nenhuma organização independente rumo à tomada do poder.

Para alguns, o simples fato de termos homossexuais dentro do Estado já é em si um avanço progressista. Porém, com a chegada de uma presidenta mulher ao poder, podemos facilmente identificar que o gênero, a etnia ou a sexualidade não garantem por si uma política emancipadora. Os projetos de lei de Jean Wyllys, com destaque para a Lei Gabriela Leite, revelam que as políticas ditas como “progressistas” não se enfrentam com a ordem capitalista, pelo contrário, neste projeto de lei, Jean Wyllys regulamenta a cafetinagem e ainda institui que só é reconhecido como exploração sexual a “apropriação total ou maior que 50% do rendimento de prestação de serviço sexual por terceiro”, o que demonstra à quem esse PL favorece. E se considerarmos que as travestis e transexuais são as mais afetadas pela prostituição compulsória (única alternativa para garantia de sua sobrevivência), o projeto de Lei não se apresenta como alternativa consequente, pois desconsidera a impossibilidade de legislar sobre a prostituição marginal da qual sofrem as TRANS*.



Se retomarmos a trajetória de Harvey Milk, primeiro homossexual declarado a assumir um cargo político nos EUA, veremos que desde sua participação na revolta de StoneWall até seu assassinato em 1978, sua estratégia era puramente reformista, mas infinitamente mais combativa à postura de Jean Wyllys, que vê no parlamento um “plano de carreira”, onde defende com unhas e dentes os super-salários. De um a outro, podemos ver que nas situações mais diversas, tanto com um parlamentar que participou da revolta de StoneWall até Jean Wyllys, que hoje nos próprios projetos de lei atacam os setores oprimidos, o reformismo não foi uma alternativa. As lutas dxs LGBT não se inserem no marco de “mais direitos”, pois a liberdade sexual exige uma superação da ordem vigente, para que nossos corpos e mentes sejam verdadeiramente livres. Enquanto a lógica capitalista de produção e lucro prevalecer nossos corpos não poderão ser mais do que objetos, nossa sexualidade mais do que uma função reprodutiva à serviço da construção de um exército de reserva e nossas mentes patologizadas por querer construir livremente nossas identidades.

- Que a universidade se coloque ao lado dxs LGBT! Que a produção do conhecimento e sua influência política garanta educação sexual nas escolas! Pela permanência estudantil das travestis e transexuais! Abaixo o Acordo Brasil-Vaticano. Pelo fim do ensino religioso, heteronormativo, binario e determinista biológ
ico nas escolas!

- Fora bancada evangélica! Fora vaticano! Pela separação da igreja do Estado! Basta de acordos e leis contra os direitos dxs LGBT, mulheres e negros!

- Que as entidades estudantis e sindicatos tomem em suas mãos a bandeira pela liberdade sexual e livre construção de identidade de gênero! Que impulsionem nas campanhas salarias e nos acordos coletivos a inclusão dxs LGBT nos planos de saúde e demais direitos trabalhistas!

- Basta de silicones industriais! Basta de mortes e lesões por não acompanhamento medico! Por um único sistema de saúde, estatizado sob controle dos trabalhadores, para garantir: aborto legal, seguro e gratuito para mulheres pobres e TRANS-homens; cirurgias de redesignição sexual, acompanhamento hormonal e psicólogos para vítimas de violência.

- Não a regulamentação da cafetinagem! Pela descriminalização da prostituição!

- Igualdade na lei e igualdade na vida! Pela aprovação da Lei João Nery! Por um sério plano de luta que garanta todos os direitos iguais para a população LGBT rumo à transformação radical da sociedade!

- Pelo fim da miséria sexual! Por casas abrigos para homossexuais e TRANS* expulsos de casa! Por espaços para a juventude exercer sua sexualidade livremente!

- Basta de assassinatos, violência e mutilações axs LGBT! Aprovação imediata da PLC 122 que criminaliza a homofobia, com comissões independentes do Estado para garantir investigação e punição para os casos de violência e assassinatos!

- Basta de estupros corretivos! Não aceitaremos a heteronormatividade compulsória! Pela livre construção da sexualidade lésbica e bissexual! E pela educação sexual preventiva a DSTs!

- Pela de despatologização das identidades TRANS*! Não há laudo para o que não é doença! Não a cura gay! Não há ciência produzida para justificar a homo-lesbo-transfobia.

Trotsky e a Teoria Permanentista da Revolução como saída revolucionária para as demandas democráticas.





Por Virginia Guitzel


Apesar do movimento revolucionário e a classe operária ainda se mantem marcados pelas profundas derrotas e traições das direções do movimento operário internacional, a chegada de uma crise capitalista de proporções históricas que é constantemente comparada a crise da década de 30, reatualiza conceitos como “luta de classes” e "revoluções" que pareciam perdidos nestes últimos 30 anos, de ofensiva ideológica burguesa combinada com o avanço do neoliberalismo e o desaparecimento da perspectiva socialista com a restauração capitalista nos antigos estados operários, em especial o leste europeu e a antiga URSS. As consequências disso também se fazem sentir no âmbito das organizações de esquerda, com o abandono das posições revolucionárias e o fortalecimento do reformismo de esquerda e na tática de partidos amplos sem delimitação de classe. Esse retrocesso do pensamento de estratégia (socialista) contribuiu para a esquerda e os partidos de trabalhadores ou se adaptassem (muitas vezes chegando a capitulação e degeneração) ou o liquidacionismo sectário que implica em pequenos grupos incapazes de testar seus programas, repetindo consignas do passado sem a dialética entre o programa e a realidade para comprová-lo.
Os revolucionários tem hoje como tarefa resgatar os fios de continuidade com o marxismo revolucionário para partindo dele, conseguir compreender o cenário internacional e nacional para então poder construir um instrumento de luta dos trabalhadores, dos povos oprimidos e dos setores oprimidos e assim garantir uma luta efetiva contra o capitalismo, pela emancipação da humanidade. Retomar as elaborações já escritas, não como autoridade inquestionável, mas como contribuições já postas e com diversas superações fruto de um longo debate interno que pôde inclusive ser testado na realidade se faz necessário para os milhares de jovens e trabalhadores que tem protagonizado convulsivos levantes por todo o mundo, em maioria, impulsionados por demandas democráticas formais como uma expressão da decadência do sistema capitalista que é “incapaz de satisfazer as reivindicações que surgem infalivelmente dos males que ele mesmo engendrou”. Mas que ao desconhecerem tais debates passados, a juventude e os trabalhadores que hoje despertam a vida política partem de recomeçar praticamente do zero a construção de uma estratégia para nos levar a vitória sob a burguesia. Acontece que não partimos do zero, partimos da dedicação de diversos revolucionários como Engels, Marx, Lenin, Rosa e Trotski e sobre seus legados é que construímos um programa para a atualidade.

A crise capitalista evidencia os limites da democracia burguesa e a necessidade da revolução socialista.

À medida que a crise econômica vai avançando, evidencia consigo mais e mais a atualidade do período chamado por Lênin de ‘Imperialismo’, no qual o mundo inteiro já foi partilhado entre a dominação dos países imperialistas somado a divisão do trabalho internacional. Esses fatores acumulam tamanha contradição entre as condições objetivas dessa sociedade que possibilitam a construção de uma sociedade socialista e a crise histórica de direção revolucionária para alcançar este objetivo. Enquanto a classe operária e os oprimidos ainda carecem de uma direção revolucionária que levante um programa pela independência política dos trabalhadores e estimule a solidariedade da classe operária com os oprimidos, fazendo com que a classe trabalhadora tome para si as bandeiras de todos os setores oprimidos (para assim tornar-se o sujeito hegemônico na luta anti-capitalista), se desenvolvem diversos outros pensamentos ideológicos fruto desses últimos trinta anos (1981-2011) de um abandono da reflexão estratégica (da tomada do poder, da ditadura do proletariado e da luta pelo comunismo). A organização da juventude hoje em diversos países está pautada com bandeiras claras de luta anti-austeridade e/ou contra a desigualdade social. Não podem, no entanto, serem consideradas como lutas anti-capitalistas pelo socialismo, pois muitas vezes acabam por defender o capitalismo do período recente com uma relativa estabilidade e o “estado de bem estar social” (nos países avançados), uma vez, que a forma mais avançada de sociedade vivenciada e conhecida por estes ativistas sempre foi a democracia burguesa
Sem a visão clara que esta democracia tem um limite bastante concreto: de classe. E que as demandas democráticas mais sentidas pela juventude e pelos trabalhadores não podem ser conquistadas pela classe burguesa. Também pouco é discutido sobre a democracia como forma de desvios revolucionários, de maquiar a ditadura burguesa e da dependência do Estado para existir democracia. Que a luta pelo fim da exploração, fim da divisão em classes passa pela luta revolucionária contra o Estado (pela tomada do poder seguida de destruição do aparelho estatal) superando assim a democracia para o comunismo.
Esse grau zero de estratégia gerou a formação de novas teorias para responder os fenômenos sociais sem a centralidade da classe operária ou de uma base marxista. Entre essas novas teorias, encontramos o autonomismo, que se apresenta mais como uma espécie de “espírito de época” do que como “teoria” propriamente dita. Se expressa mais claramente na organização, majoritariamente, da juventude como o movimento Occupy Wall Street (OWS, nos EUA), #Yosoy132 (movimento surgido no Mexico nas eleições presidenciais de 2011) e os Indignados na Espanha, tem como principais pontos débeis a falta da compreensão do papel estratégico dos trabalhadores (e da aliança da juventude com eles), a necessidade da tomada do poder (lutar por demandas por fora do regime capitalista) e talvez o ponto mais distante da reflexão destes grupos: a necessidade da construção de um partido marxista revolucionário para impedir que os patrões e governo descarreguem a crise capitalista (por eles gerada) nas costas dos trabalhadores e assim impor a estes mais anos de submissão, exploração e opressão. 
É nesse novo período em que nos encontramos que as demandas democráticas tomam um papel superior para os revolucionários. Paralelamente aos levantes da juventude, que atuam como caixa de ressonância das contradições do capitalismo, vem avançando muito lentamente e repleto de dificuldades, o processo de reorganização subjetiva (como vemos o caso da conformação do IPT, Partido dos Trabalhadores na Bolívia, a fundação de mais de 1000 sindicatos independentes da central estatal no Egito, desde a queda de Mubarak e o processo de Sindicalismo de base na Argentina). Enquanto a classe operária vai bem lentamente recuperando sua independência dos patrões e começando a se reorganizar, a burguesia muitas vezes apoiando-se nas instituições religiosas grita demagogicamente a favor da democracia e até concedem alguns direitos formais para cooptar setores oprimidos acomodados, para provocar um confusionismo dentro do movimento e a tentativa de relocalizar os governistas para capitalizar eleitoralmente todas essas discussões.
 Indicam como Papa, um Francisco, em alusão a sua “ligação igualitária com os pobres” e encobrem as manchas de sangue que o ex-Guarda de Ferro Bergoglio traz da sua cumplicidade com a ditadura argentina; no Brasil o parlamento burguês aprova a união homoafetiva na mesma semana que indicam um pastor racista e homofóbico à presidência da Comissão de Direitos Humanos (e ainda se mantém no poder, apesar de todo rechaço nacional e midiático); aprovam política de cotas nas universidades e depois tentam e intensificam a repressão policial e o assassinato de jovens pretos e pobres nas periferias; É nesse cenário que urge à classe operária levantar um programa que responda aos interesses dos setores oprimidos pelo capitalismo e que não podem ter na burguesia nenhuma ilusão de solução para as mínimas questões democráticas.
Ao mesmo tempo que se expressa uma reação com a marcha de milhares contra a aprovação do casamento homoafetivo na França, a conquista dessa aprovação tem que ser vistas nos marcos das conquistas por dentro do regime capitalista, como dizia Marx:

Não há dúvidas de que a emancipação política representa um grande progresso e, embora não seja a forma mais elevada da emancipação humana em geral, é a forma mais elevada da emancipação humana dentro da ordem do mundo atual[1].

Apesar dos revolucionários não reivindicarem o casamento, por conta da sua constituição histórica (opressão as mulheres, forma de relação burguesa – constituição de família, baseada na propriedade privada -, valores possessivos, etc), não nos colocamos contra a inclusão dos LGTTBIs na igualdade de direitos, ainda que tenhamos de forma clara seus limites. Nos colocamos como linha de frente na luta por sua emancipação política (inclusão total, garantia de todos os direitos, dentro do regime capitalista), porém defendemos um programa com independência política dos trabalhadores e dos oprimidos justamente para que vá além da emancipação política, da democracia burguesa, etc. Queremos emancipar a humanidade de toda exploração e dominação da burguesia sob nós. Queremos nós, trotskistas, até o fim, alcançarmos nosso objetivo da construção de um novo mundo, livre da dominação burguesa (aperfeiçoada com as opressões) e da exploração capitalista, assim mudando radicalmente a natureza dessa sociedade que é baseada na divisão de classes, e portanto na necessidade de um Estado.

A visão permanentista de Trotsky para responder as demandas dos oprimidos e dos trabalhadores.

Ainda que possa parecer difícil estabelecer uma relação direta entre o dirigente da revolução russa, com as questões democráticas tais como sentidas hoje, muito por conta de toda propaganda feita da URSS e do stalinismo como “socialismo real”, isso é, única forma possível de socialismo. Basta apenas fazermos um resgate histórico do papel que este militante revolucionário teve no combate ao stalinismo e suas políticas reacionárias com os trabalhadores e os oprimidos (perseguindo operários e retrocedendo em diversos avanços conquistados em 1917 como a naturalização das relações homoafetivas e o direito ao aborto, para citarmos como exemplo). Veremos que muito além do grande dirigente da classe operária, Trotsky elaborou a partir de sua visão permanentista da revolução[2], bases ideológicas e programáticas que para além da necessidade de expandir do nível nacional, ao internacional até alcançar mundialmente, via claramente a necessidade de se estabelecer uma base econômica planificada democraticamente (portanto, organizada) para que a revolução se desse em todos os níveis.
Ao retomar Engels, em a Origem da Família, da propriedade privada e do Estado, Trotsky recupera a compreensão histórica do processo do avanço da atividade humana (o trabalho) que se desenvolveu de forma com que o trabalho masculino da caça e posteriormente da agricultura possibilitassem a produção de excedente à sobrevivência imediata, o que significou um tempo livre, que antes era totalmente utilizado no trabalho para a sobrevivência destas tribos. Com a produção de excedente, o trabalho masculino começou a se sobrevalorizar ao trabalho feminino, que por conta das mulheres biologicamente serem responsáveis pela amamentação tinham de ficar próximas da tribo, onde estavam as crianças menores, impedindo-as de desenvolver o trabalho masculino que era, majoritariamente, fora da aldeia. Essa sobrevalorização do trabalho masculino e a produção de um excedente (produto amais do que a necessário para a subsistência) possibilitou que houvesse algo a ser transmitido para futuras gerações, assim para garantir que esse excedente ficasse dentro daquela família se fazia necessário saber quem era o progenitor (criando assim o conceito de hereditariedade e transformando o fruto desse trabalho apropriado por apenas estes, transformando então em propriedade privada). Assim ocorreu o inicio da divisão entre homens e mulheres (não natural, mas social), tornando-se necessário a opressão as mulheres, impondo-as a monogamia como forma de certificar de que aqueles filhos – que herdariam esta propriedade, agora privada, antes comunal – eram realmente daquele homem (o único que mantinha relações sexuais com a mãe. O fim da matrilinearidade significa não a simples mudança de organização da família ou a linhagem daquelas tribos, mas é a marca do inicio da divisão entre os homens e a mulheres e também entre as classes.

Partir da origem da opressão a mulher que Engels elabora a partir de rascunho deixados por seu companheiro Marx, evidencia que a luta contra a divisão da humanidade em classes, da dominação burguesa e a defesa da centralidade da classe operária enquanto principal sujeito revolucionário nunca esteve em detrimento de defender o direito dos LGTBBI’s, das mulheres e dos negros. Ao contrário, era exatamente por compreender que “aqueles que lutam com mais energia pelo novo foram os que mais sofreram com o velho” e que a única maneira de lutar pelo direito dos oprimidos passava, irremediavelmente, pela organização destes setores a partir da classe trabalhadora e da atuação desta como tribuna do povo, hasteando bem alto as bandeiras democráticas mais sentidas pelo conjunto da população, que Trotsky se forjou como um grande dirigente revolucionário. É colocando historicamente o desenvolvimento da humanidade que se faz claro a visão abrangente que se explicita nos escritos dos marxistas.

Ainda que o revolucionário bolchevique não tenha se debruçado em elaborar um programa especifico para a questão LGTTBI[3], Trotsky se pautou sobre os avanços de Engels no          campo da origem da família, da propriedade privada e do Estado, no programa de Bebel e, principalmente, de Clara Zetkin e Alexandra Kollontai sobre a questão das mulheres, escreveu criticamente sobre a moral da burguesia e dos revolucionários e também se debruçou sobre as minuciosas questões do modo de vida dos russos.

A lógica permanentista da revolução dá bases para a compreensão de que a luta contra o patriarcado e as demais opressões, devendo começar conjuntamente com a luta contra a dominação capitalista, só pode triunfar plenamente sobre as bases de uma economia que não seja voltada para o lucro, a acumulação e a propriedade privada, mas sim em base à democracia do trabalho, à propriedade comum dos meios de produção e, assim, à livre expressão da sexualidade sem as barreiras impostas por uma sociedade dividida em classes. Isso é, não é possível abandonarmos as questões materiais, concretas nas quais o capitalismo se apoia para perpetuar as opressões. É da necessidade concreta de manter a divisão da humanidade em classes sociais, que se é necessário a manutenção da hereditariedade, da propriedade privada e portanto, a família.
Nesse sentido, herdamos a história de luta dos setores oprimidos e da classe operária e as ferramentas do marxismo revolucionário como bases para elaborarmos um programa capaz de responder às demandas democráticas que as burguesias, desde o final do século XIX, já não são mais capazes de responder (sem falar que, como classe proprietária, jamais o foi, por questões estruturais, mesmo em sua fase “heroica”].

Trotsky, por sua vez, se diferencia radicalmente da maioria dos grupos de oprimidos pela estratégia que carrega. A compreensão do capitalismo internacional e a elaboração de um programa capaz de modificar radicalmente os pilares da sociedade capitalista fez com que ele enxergasse as demandas democráticas desde uma perspectiva socialista revolucionária, desde uma compreensão das opressões que não se desliga da exploração capitalista, nem da questão das classes sociais e muito menos da necessidade de uma saída coletiva para emancipar a humanidade. Por isso o combate a fragmentação e ao isolamento da classe trabalhadora precisa ser também uma preocupação para estes setores. Por isso também que a denúncia à ilusão no Estado e no parlamento burguês em responder as demandas dos trabalhadores também serve para os oprimidos, pois são analises e lições tiradas de processos já vividos por lutadores que expressam uma compreensão do sistema vigente, reflexão essa que é fundamental para qualquer revolucionário poder pensar política, estratégia e programa para libertar a humanidade da divisão de classes que sociedade anterior nenhuma foi possível.


A relação entre a consciência atual da classe operária e avanço da revolução no modo de vida e na moral.

O dirigente russo apontava em seu livro Questões do modo vida, escrito em 1923, quando se analisava a revolução russa não mais como uma revolução burguesa e que se isso significava não mais só planificar a economia, expropriar as empresas da burguesia, mas mudar radicalmente os pilares da sociedade capitalista: sua moral, educação e sua ideologia há tantos anos martelada na consciência dos trabalhadores e da população russa.


É muito interessante estabelecermos um paralelo, ainda que rápido (e sem pretensões de aprofundarmos tanto, neste artigo) sobre a relação entre o nível de escolaridade, de educação, de condições materiais de existência de uma classe operária (como a Russia, num país com fortes traços ainda feudais) para alcançar a revolução no modo de vida e na moral afundada na ideologia burguesa. Dizia Trotsky:


Estabelecer a igualdade económica do trabalhador e da trabalhadora na fábrica, na oficina, no sindicato, é já muito difícil. Mas estabelecer a igualdade efetiva do homem e da mulher na família, eis o que é incomparavelmente mais complicado e exige imensos esforços para revolucionar todo o seu modo de vida. E, no entanto, é evidente que enquanto a igualdade do homem e da mulher não for atingida na família, não se poderá falar seriamente da sua igualdade na produção nem mesmo da sua igualdade política, pois se a mulher continua escravizada à família, à cozinha, à barrela e à costura, as suas possibilidades de agir na vida social e na vida do Estado conservam-se reduzidas em extremo (...)

Como já se disse, acontecimentos de importância considerável — a guerra e a revolução — subverteram o modo de vida familiar, trouxeram consigo o pensamento crítico, a reorganização consciente e a reavaliação das relações familiares e do modo de vida quotidiano. É precisamente a combinação da força mecânica desses grandiosos acontecimentos com a força crítica do pensamento que explica, no domínio da família, o período destrutivo que hoje conhecemos. É somente hoje, após a tomada do poder, que o operário russo dá os seus primeiros passos na via da cultura. (...)[4]

As diversas referencias que Lenin e Trotsky faziam sobre o que seria uma revolução na Alemanha ou nos EUA estavam obviamente ligadas ao papel econômico que ambos países cumprem no cenário internacional. A influência destes e o tamanho da classe operária nestes países de capitalismo avançado (com o desenvolvimento avançado da indústria naquela época), já davam razões suficientes para preferir “trocar” uma revolução num país como a Rússia bastante isolado e sem a mesma influencia internacional, por uma revolução nestes países centrais. Mas para além disso, também pode-se dizer que num país onde a educação está minimamente disseminada na classe trabalhadora é extremamente mais fácil conseguir combater a ideologia burguesa e a moral constituída em base a propriedade privada e a exploração capitalista. Por razões lógicas como a alfabetização dos trabalhadores, noções básicas de matemática e de localizações geográficas, colaboram muito para a desconstrução desses valores arraigados e a reflexão para a construção de um novo homem.

Dois inimigos da classe trabalhadora e dos oprimidos: Stalinismo e imperialismo.
           
De outra perspectiva, podemos encarar Trotsky como uma referencia aos oprimidos (para além do movimento operário) pelo seu combate intransigente ao stalinismo e ao imperialismo (os principais responsáveis pela opressão e exploração que seguem em nossas vidas), sendo seu principal opositor. Para os revolucionários, o imperialismo significa “reação em toda linha”, é a burguesia mais poderosa e reacionária que se mantém as custas da exploração de nossa classe e da opressão aos povos e setores oprimidos. Por outro lado, o stalinismo com sua teoria de “socialismo em um só país” teoriza a derrota do movimento pela emancipação humana (o comunismo).
Enquanto nos anos de ofensiva neoliberal o imperialismo conquistava sua hegemonia e disseminava sua ideologia do fim da histórica, fim da classe operária e fim da possibilidade de mudança socio-economica também consolidava a identificação no imaginário popular entre o socialismo e a luta por outro tipo de sociedade com o stalinismo. É desse confucionismo que os revolucionários hoje precisam enfrentar. Pois ao apontar o stalinismo (e toda sua carreira de derrotas, traições, retrocessos das conquistas de outubro: como a naturalização das relações não reprodutivas; o direito ao aborto;) como “o socialismo possível” cria-se um distanciamento da juventude e da classe trabalhadora de uma perspectiva socialista nas lutas contra os patrões e governo. O combate aos dois principais inimigos da classe trabalhadora e dos oprimidos é parte essencial para triunfar a luta revolucionária. Por um lado derrotando a burguesia dos países avançados, contagiando a classe operária de diversos países. E por outro combatendo a visão reacionária de comparar o stalinismo ao movimento revolucionário, demonstrando que os revolucionários defendem a divisão da riqueza e os avanços de uma sociedade livre da exploração, onde os indivíduos tornem-se sujeitos e peguem sob suas mãos o futuro da humanidade.
Combater a teoria do socialismo em um só país e todo o processo de burocratização da URSS (assim como a perseguição aos trotskistas e aos opositores que também eram acusados de trotskistas para manter Stalin com sua hegemonia) era parte de demonstrar o quão falido era o programa proposto para a Internacional comunista que não só negava o marxismo revolucionário continuado por Lenin e Trotsky, mas também explicitar os caminhos opostos que este programa e a luta pela emancipação humana caminhavam. Pois partimos de que o próprio sistema capitalista já é por si só internacional e a impossibilidade de existir uma ilha socialista em meio a um mar capitalista pelo peso internacional que atinge diretamente todos os países que estão inseridos na divisão social do trabalho. A coexistência de sistemas político-econômicos antagônicos não pode durar por muito tempo, isso é exemplificado pela revolução de 1917, onde mesmo com a tomada do poder e a conquista de diversas demandas democráticas pelos trabalhadores, o isolamento da ex-URSS foi o principal elemento do surgimento da burocracia stalinista e da posterior restauração capitalista neste país.

            Por isso as organizações de oprimidos, os sindicatos e os partidos de trabalhadores precisam se comprometer em varrer de uma vez toda a herança stalinista que ainda sobrevive na esquerda internacional. E se colocar num combate intransigente ao imperialismo, como questões mínimas para defender verdadeiramente os setores oprimidos e a classe trabalhadora. Os revolucionários não podem se omitir deste debate, pelo contrário, devem ser os primeiros a pauta-lo. Para que sejam rapidamente superados e que a partir de posicionamentos claros possamos disputar novos setores para combater o capitalismo.

A vigência da teoria da revolução permanente frente a “revolução democrática”.

A teoria da revolução permanente foi desenvolvida em base às experiências do movimento revolucionário internacional e no combate às principais polarizações dentro deste servindo então para orientar a elaboração de um programa verdadeiramente revolucionário que se testasse na realidade. Trotsky dizia que em países de capitalismo atrasado ou semicolonial não se faz possível ou necessário o desenvolvimento de todas as potencialidades do capitalismo para que depois avançasse a luta por uma sociedade comunista, como defendiam os mencheviques. Já que as burguesias nacionais destes países nascem espremidas pela burguesia imperialista e pela força do seu proletariado tornam-se incapazes de desenvolver ou responder as demandas democráticas estruturais para a população e os trabalhadores, e quando fazem concessões mínimas formais em prol de barrar a organização da classe trabalhadora e sua unificação, logo que possuem a oportunidade as retiram. Ou seja, em países como o Brasil, nada se pode esperar do estado burguês para responder a essas demandas. Responder a essas demandas democráticas só pode se dar como tarefa da classe operária organizada em um partido revolucionário marxista, que avance até tornar poeira o antigo sistema social dividido em classes.
A tomada do poder, porém, é somente a primeira etapa para a transformação radical da sociedade. A teoria da revolução permanente não visa apenas à planificação da economia e o fim da sociedade dividida em classes, mas sim, ter essas bases materiais conquistadas para poder desenvolver a humanidade na sua potencialidade máxima. Isto é, poder acabar com a desigualdade social (miséria, fome, desemprego, violência policial, ditadura de classe, etc) para poder reeducar a humanidade sob bases comunistas. Uma educação radicalmente diferente da que temos hoje, criada para nos introduzir no mundo capitalista revestido de egoísmo, opressões e defesa da propriedade privada e do statos quo.
Para nós trotskistas, partimos que da compreensão de que não é possivel conquistar a revolução sexual sem as bases estabelecidas de uma revolução social, e de que a revolução social tem de ser encarada como a porta para o caminho da revolução em todos os níveis, assim que enxergamos a teoria da revolução permanente como a teoria que mais é capaz de armar os oprimidos na luta por sua emancipação, que não pode ser por dentro do regime burguês. É através da compreensão da realidade objetiva e da necessidade da construção de um partido revolucionário com forte apropriação marxista que se avança na luta contra o capitalismo que tem como pilares da exploração o machismo, a homofobia e o racismo – isto é, de formas do estranhamento social que são historicamente anteriores ao capitalismo, mas das quais ele cedo aprendeu a se servir para seus próprios fins, e por isso passou a reproduzir à sua maneira.


 Nesse sentido, estão estabelecidas diversas tarefas para os revolucionários hoje. Na ordem do dia é urgente a construção do partido da revolução socialista com um programa revolucionário que seja a expressão destes debates acumulados no interior de processos vivos da luta de classes. Por essa tradição que se faz hoje necessário a polêmica entre a Teoria da Revolução Permanente defendida por Trotsky e a revolução democrática atualização realizada pelo fundador da LIT-PSTU, Nahuel Moreno.

Esta elaboração teórica de Moreno se apoiava na citação do texto O programa de transição, de Leon Trotsky que dizia:

Paralelamente, desenvolvemos uma incansável agitação em torno das reivindicações transitórias que deverão, do nosso ponto de vista, constituir o programa do "governo operário e camponês".

É possível a criação de tal governo pelas organizações operárias tradicionais. A experiência anterior mostra-nos, como já vimos, que isto é, pelo menos, pouco provável. É, entretanto, impossível negar categórica e antecipadamente a possibilidade teórica de que, sob a influência de uma combinação de circunstâncias excepcionais (guerra, derrota, quebra financeira, ofensiva revolucionária das massas etc.), os partidos pequeno-burgueses, incluídos aí os stalinistas, possam ir mais longe do que queriam no caminho da ruptura com a burguesia. Em todo caso, uma coisa está fora de dúvida: se mesmo esta variante pouco provável se realizasse um dia em algum lugar, e um "Governo operário e camponês", no sentido acima indicado, se estabelecesse de fato, ele somente representaria um curto episódio em direção à ditadura do proletariado. [5] (grifo meu).

Se analisarmos que essa teoria foi criada num momento muito especifico de revoluções com estados operários deformados (nascidos já sem a classe operária a frente ou uma organização revolucionária baseados nos princípios marxistas) veremos que essa teoria reflete bastante um espirito da década de 80 e 90 que frente a ofensiva burguesa e a restauração capitalista em diversos países do leste europeu e da principal referencia ao socialismo, a ex-URSS, parecia-se muito plausível que a exceção – sem muita credibilidade – descrita por Trotsky se tornasse, como afirmara Moreno, em regra.
Numa carta escrita por Moreno enviada a uma agrupação de juventude da Convergência Socialista, em 1984, chamada Alicerce, o fundador deste partido explica, a partir do balanço que faz do pós-segunda guerra mundial, a aplicação de sua revisão da teoria da revolução permanente:

“A [definição de situação revolucionária] de Trotsky, que dá quatro condições que a caracterizam: primeiro, uma crise muito aguda da burguesia; segundo, giro massivo da pequena-burguesia contra o regime; terceiro, vontade e organização revolucionária do movimento operário; quarto, a existência de um forte partido marxista revolucionário que dirija as massas e esteja firmemente disposto a tomar o poder (...) Mas, como já dissemos muitas vezes, neste pós-guerra triunfaram muitas revoluções, não só situações revolucionárias, sem maior influência da classe operária e sem que esta acaudilhe como classe o processo revolucionário (a terceira condição de Trotsky). Tampouco se deu nenhum triunfo revolucionário que tenha sido dirigido por um partido marxista revolucionário (a quarta condição de Trotsky) (...) Acreditamos estar perto da solução do problema: as duas primeiras condições de Trotsky (a crise burguesa e o giro da pequena-burguesia contra o regime dominante), algumas vezes foram suficientes para dar origem a situações revolucionárias, umas traídas por suas direções e outras, apesar destas, que levaram ao triunfo da revolução.”[6]


Uma vez afastados desse período histórico e ainda mais no cenário atual de cinco anos de uma crise econômica que reatualiza toda a teoria revolucionária desenvolvida pelos revolucionários russos colocam essas atualizações em prova e demonstram rapidamente sua ineficácia. Se quando elaborada essa teoria ela expressava uma adaptação, muito ligada a uma degeneração da esquerda, principalmente do movimento trotskista, hoje ao testá-la na realidade e ignorar suas debilidades torna-se uma capitulação que produz em algumas ocasiões uma omissão ao imperialismo como chegou as posições da LIT-PSTU em sua análise ao processo revolucionário na Líbia.

A importância desse debate é apontar as duas principais debilidades que essa teoria carrega para a luta da emancipação da humanidade. Expressam como resultantes dessa teoria: 1. A falta de prioridade no combate ao imperialismo. 2. A ilusão de que outros movimento sociais – que não a classe operária organizada por um partido revolucionário marxista em luta revolucionária contra a burguesia – seria capaz de conquistar as demandas democráticas. A visão, da qual chamamos de semi-etapista ou semi-menchevique, parte da separação entre a revolução democrática e a revolução socialista.
Assim como separa o combate aos regimes do combate ao imperialismo. Essa separação, parte da compreensão da revolução em duas etapas ainda que não se liguem diretamente com a teoria dos mencheviques (que defendiam que era necessária primeiro a revolução burguesa para depois a revolução socialista) carrega consigo alguns traços desse pensamento. Por um lado isso acaba por levar a uma política de não fomentar a auto-organização dos oprimidos em aliança com os trabalhadores para conquistar suas demandas, mas em confiar em forças externas como o parlamento burguês (com as campanhas promovidas pelo PSTU em relação a lei Maria da Penha e a defesa da ampliação de delegacias de mulheres) e por outro lado pela sua própria lógica de quais as tarefas dos revolucionários hoje.

A falta de um combate incisivo ao imperialismo também acaba por ficar secundarizado pela lógica de combater os regimes ditatoriais e pela visão da democracia (burguesa) como um avanço na liberdade e não como um desvio ou como diria Trotsky “uma revolução abortada”. Essa visão orientadora desse partido acaba por leva-los a um retrocesso na luta revolucionária pois foca-se na discussão fascismo X democracia, quando a pauta real deveria ser: estado burguês X estado operário.

            A prática por sua vez submetida a essa teoria que não só atualiza, mas nega o legado trotskista não servirá para transformar os processos revolucionários “surdos, cegos e mudos” em revoluções socialistas. Não contribuem para o avanço da consciência das massas, muito menos como defesa intransigente aos negros, mulheres e LGTTBIs que sem um rearme estratégico tem de começar do zero a analisar a realidade e teorizar sobre seus aspectos fundantes e os caminhos para sua transformação.

Sem glorificar ou de maneira artificial atribuir ao dirigente russo o papel de defensor dos oprimidos, exemplifiquei acima como é fruto deste trabalho que hoje temos um programa capaz de armar os oprimidos para lutar pela emancipação humana, pelo comunismo, que foi sem dúvida o sonho de todos os lutadores que dedicaram sua vida ao movimento revolucionário. Que ainda é o nosso. E que será a realidade das futuras gerações.





[1] Glosas críticas Marginais ao artigo “O rei da Prússia e a reforma social” de um prussiano. 1848.
[2] Revolução Permanente é uma teoria elaborada por Leon Trotsky, desde antes de 1917 que com o avançar dos anos, dirigente do exercito vermelho pode aprimorá-la e exemplifica-la no livro ‘A revolução Permanente’ e no “Programa de Transição”.
[3] O que é preciso tomar nota que o movimento LGTTBI (Lésbicas, Gays, Travestis, Transexuais, Bissexuais e Intersex) ainda não tinha forças, nem essa forma de organização (com demandas claras e um sujeito definido) que pressionasse o movimento revolucionário a dialogar com tal opressão. Isso não significa, todavia, que os revolucionários de nada aportaram para isso. Pelo contrário, como se vê em 1917, era parte da revolução naturalizar as relações sexuais não reprodutiva como interesses individuais, onde o Estado mantinha-se indiferente, sem interferência, enquanto essas relações fossem concedidas e livres.
[4] Trecho do sexto capítulo, 'Da antiga à nova família', em Questões do Modo de Vida, Leon Trotsky, 1923.
[5] TROTSKY, Leon. Programa de transição. IN: CAP 13, O governo operário e camponês. (http://www.marxists.org/portugues/trotsky/1938/programa/cap02.htm)
[6] Carta de Nahuel Moreno à direção da Alicerce - Começou a revolução brasileira? Buenos Aires, 11 de Maio de 1984.  Permanente’ e no “Programa de Transição”.