segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

JUSTIÇA PARA TODAS AS KATHALINAS! BASTA DE AGRESSÕES À TRAVESTIS!



Por Virginia Guitzel e Marie C,
 ativistas LGBTTI e militantes do Pão e Rosas e Juventude ÁS RUAS.


Na sexta-feira, dia 15 de Novembro, Kathalina Friedman, militante TRANS* do grupo de mulheres Pan y Rosas, ativista LGBTTI da agrupação A quemar el Closet e revolucionária do Partido dos Trabalhadores Revolucionários (PTR, organização irmã da LER-QI no Chile) foi brutalmente agredida por 10 homens (provavelmente organizados) à sua espera, na porta de casa. Com grandes lesões, traumatismo craniano leve e fratura nasal, foi encontrada pelos vizinhos, e levada ao hospital por militantes da agrupação Pan y Rosas, após o abandono pela polícia.

Numa das cidades mais conservadores do Chile, Antofagasta, ocorre mais um caso de agressão as travestis. Felizmente, dessa vez, não foi silenciado. Com fortes mobilizações e desde onde estamos impulsionando campanhas a nível internacional, faremos a voz de Kathalina ecoar a voz de milhares de travestis e transexuais mortas, torturadas, mutiladas todos os dias, pela polícia, por grupos nazifascistas, por seus companheiros ou por “clientes da prostituição”. Dar voz e nomes aos casos das travestis assassinadas em BH no começo de Setembro, as denuncias publicas de Luisa Marilac, da travesti de Guarulhos assassinada com 20 facadas no rosto e teve seu penis cortado e que nada se ouviu falar.
O caso de Kathalina Friedman não pode ser encarado apenas como mais um caso de transfobia, mas como um ataque político a uma referencia revolucionária que cotidianamente luta pelo fim do genocídio as mulheres trans*, pelo direito ao próprio corpo, pelo fim da herança da ditadura pinochetista e pela separação da igreja do Estado. Por isso enviamos nossa solidariedade a companheira e nos colocamos na linha de frente para colocar uma enorme campanha pela punição imediata desses covardes, e desde já abrindo um importante debate sobre o combate a violência as TRANS*. 

Para assinar o abaixo assinado envia teu nome para: panyrosastf@gmail.com
Acompanhe a luta apor Justiça para Katha http://justiciaparakatha.wordpress.com


Violência as mulheres TRANS* também é violência de gênero.

Nesse dia 25 de Novembro, dia internacional do combate a violência da mulher, devemos levantar a bandeira das mulheres lésbicas, travestis e transexuais que frequentemente são omitidas pelas organizações de esquerda e movimentos feministas. A luta contra o machismo não se separa do combate intransigente a transfobia, homofobia e o racismo que atinge diretamente as mulheres negras e lésbicas.

O sistema capitalista que se apropria das opressões como maneira de aperfeiçoar sua dominação de classe, proíbe nossa livre construção de sexualidade e de identidade de gênero, pois organiza-se para o lucro, em busca de intensificar a exploração proibindo nosso livre desenvolvimento, utilizando-se da educação burguesa (ensinada nas escolas e produzida e reproduzida nas universidades) para naturalizar a heteronormatividade e as identidades  não TRANS* para assim criar “policiais” dentro da sociedade que combatam cotidianamente a liberdade sobre nossos próprios corpos e mentes.

Encarar a violência contra as TRANS* como parte da luta anticapitalista é a única maneira de encarar seriamente uma triste realidade social. A perspectiva de vida de nós travestis e transexuais permanece apenas de 35 anos. As causas de não envelhecermos são diversas: a perpetuação da visão de doença sobre nossa construção de gênero restringe nosso acesso a saúde, impondo a falta acompanhamento no uso de hormônios, o uso de silicone industriais, a exclusão escolar e a precarização do trabalho, quando escapamos da prostituição, o alto índice de doenças sexualmente transmissíveis pelas condições impostas pela prostituição, estupros e falta de acesso a preservativos, o ódio incentivado pelas bancadas religiosas desde o Parlamento (No Brasil, Marco Feliciano, Jair Bolsonaro, Silas Malafaia e tantos outros são símbolos da homofobia) e os ataques de grupos nazifascistas como os que cercaram covardemente Kathalina e tantas outras pelo país.

Nenhuma confiança no Estado e em suas instituições: Retomar Stone Wall.

O abandono da polícia para socorrer Kathalina Friedman não é uma surpresa para nenhum ativista LGBTTI, tampouco para a população negra que vive nas periferias cercada pelas UPPs, que sumiram com Amarildo e mataram Douglas Rodrigues, sem nem saber porque levou o tiro. A desconfiança nas forças armadas do Estado é parte de um instinto de sobrevivência. O combate a polícia, que não dissemina o preconceito, mas é o agente de milhares de mortes em todo o mundo, é parte da moral que resgatamos de Stone Wall.

A desconfiança na polícia nas massas travestis e transexuais é a base que temos que nos apoiar para evidenciar que tampouco outras instituições burguesas podem resolver a violência ou a marginalização que sofremos todos os dias. A lei Maria da Penha, há 7 anos implementada, demonstra como é insuficiente a batalha por leis como a PLC 122, que criminaliza a homofobia, pois a igualdade perante a lei, não significa a igual perante a vida, não a toa, todos os cidadãos possuem o mesmo direito “independente” se são donos de grandes propriedades ou se são trabalhadores precarizados. Essa “igualdade” é feita de papeis molhados da democracia dos ricos, que garante apenas ilusão e contenção das massas para que não lutem de fato pela transformação radical dessa sociedade.

Por isso, é preciso nos apoiar nos mais avançados exemplos do Movimento LGBTTI, desde as revoltas espontâneas como o caso de Stone Wall, quando em 1969, travestis e lésbicas lideraram a insurreição LGBTTI contra a polícia, prendendo os agentes do Estado capitalista dentro do bar que os LGBTTI frequentavam, colocando fogo e dizendo basta a repressão polícia homo-lesbo-trans-fobica que sofriam. Assim como a busca de grupos como FHAR (Frente Homossexual de Ação Revolucionária) na França e o grupo SOMOS que dividiu aguas no movimento LGBTTI brasileiro, ao se recusar a organizar um piquenique no Ibirapuera, em meio  ao acenso operário de 79, e se dirigiu a vila Euclides para apoiar a luta dos trabalhadores contra a ditadura, recebido por estes, com aplausos e assovios.

A necessidade da auto-organização: O papel dos sindicatos e entidades estudantis na luta contra a transfobia.

A única maneira de avançarmos de forma consequente no combate a violência é nos organizarmos na luta revolucionária por uma sociedade onde possamos ser plenos e nossa sexualidade e construção de identidade de gênero livres. Para isso, é necessário dar passos firmes para garantir nossa sobrevivência, segurança e fortalecer os organismos que podem retirar das mãos da burguesia e de seus aliados como a Igreja e os políticos corruptos o poder do Estado.

Nesse sentido, que nós desde o Pão e Rosas defendemos firmemente a necessidade da organização dos LGBTTI e de todos os setores oprimidos ligado a classe trabalhadora, retomando para si suas ferramentas políticas de organização, as entidades estudantis e os sindicatos para que possamos efetivamente propagandear cotidianamente a necessidade de forjar uma aliança de carne e osso entre os setores mais oprimidos da sociedade capitalista com a classe revolucionaria capaz de destruir o Estado capitalista e erguer um Estado operário, capaz de garantir as condições materiais para o fim de todas as opressões.

Somente constituindo desde já as bases para essa aliança, incentivando uma sensibilidade com os setores oprimidos no seio da classe trabalhadora, muitas vezes se enfrentando com os anos de hegemonia burguesa consolidados na propagando dos grandes meios de comunicação, do ensino burguês nas escolas e da reprodução em piadas, é que podemos avançar na luta dos setores oprimidos, rumo a revolução socialista.

 
INVESTIGAÇÃO E PUNIÇÃO JÁ! JUSTIÇA PARA KATHALINA FRIEDMAN! MAIS NENHUMA TRAVESTI AGREDIDA, MUTILADA OU ASSASSINADA!

POR COMISSÕES INDEPENDENTES DO ESTADO E DOS GOVERNOS, ORGANIZADAS POR MOVIMENTOS LGBTTI, DE MULHERES E NEGR@S JUNTO DAS ORGANIZAÇÕES DE ESQUERDA E DOS TRABALHADORES PARA INVESTIGAR E PUNIR OS AGRESSORES E ASSASSINOS!

QUE OS SINDICATOS E ENTIDADES ESTUDANTIS TOMEM PARA SI A BANDEIRA DOS SETORES OPRIMIDOS!

PELA SEPARAÇÃO DA IGREJA E DO ESTADO! BASTA DE ACORDOS E LEIS CONTRA OS LGBTTI, MULHERES E NEGR@S!

PELA LIVRE SEXUALIDADE E CONSTRUÇÃO DE GÊNERO!


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Contribuição LGBTTI para o Encontro de Trabalhador@s, Estudantes, Mulheres, Negr@s e LGTTBI!

Reproduzimos abaixo a Contribuição LGBTTI escrita por Virginia Guitzel e Gustavo Melo para o Encontro de Trabalhador@s, Estudantes, Mulheres, Negr@s e LGTTBI


A situação dos LGBTTI no Brasil e no mundo

O Brasil é considerado o país mais homofóbico do mundo, superando os 78 países que possuem essa opressão institucionalizada. Ainda neste triste cenário, a lesbianidade/transexualidade/homossexualidade são consideradas como um crime, que em pelo menos cinco países se aplica a pena de morte. Mesmo com todas as mentiras do governo de Lula e Dilma, que se diz um governo dxs trabalhadorxs e que defende os setores oprimidos, a homofobia cresceu 117% nos últimos sete anos. A ideia de “um governo para todos” se contradiz com a realidade que se tem de escolher entre Feliciano e os direitos básicos da população LGBTTI, como fizeram xs dirigentes do PT em nome de uma pretensa governabilidade, em 2012. E assim como o direito das mulheres - como a autodeterminação de seus corpos e a legalização e gratuidade do aborto para não morrer desamparadas; nossos direitos foram trocados por votos e alianças eleitorais. O Brasil do pleno emprego segue com os LGBTTI nos postos de trabalho mais precários em geral terceirizados – limpeza ou telemarketing[1] - e a maioria dxs TRANS* condenadxs à prostituição como única forma de sobrevivência[2].
Os ataques desde o governo, que se diz laico, mas segue com suas inescrupulosas alianças com a Igreja e setores conservadores, interferindo nas vidas e decisões pessoais principalmente das mulheres e LGBTTI; que cedeu 118 milhões para a vinda do Papa, e segue com acordos como o feito por Lula - Brasil-Vaticano, em 2008 - são inúmeros. Seu clímax foi a suspensão ao Kit Escola sem Homofobia que, mesmo com questionável qualidade, possibilitava pela primeira vez na história do Brasil materiais de fácil acesso e uso que problematizavam diversidade sexual e de gênero para as escolas. Outro exemplo do descaso do governo petista foi o silêncio frente à tentativa de aprovação do projeto da “Cura Gay”, exercendo um retrocesso de 22 anos, quando ainda se tinha o termo homossexualismo[3], relacionando a sexualidade homoafetiva com uma patologia, doença, e assim passível de cura pelxs psicólogxs – o que contraria os pareceres da maior representação dessa classe no Brasil, o Conselho Federal de Psicologia. Soma-se a este atentado aos Direitos Humanos o Estatuto do Nascituro (conhecido como “Bolsa Estupro”), projeto reacionário que institucionaliza a legitimação do estupro corretivo, uma vez que as mulheres não podem decidir sobre seu próprio corpo.
                Este ano, assistimos cenas bizarras do governo russo de repressão aos/ LGBTTI. Trata-se de uma expressão dos retrocessos do stalinismo no primeiro país a igualar perante o Estado heterossexuais e LGBTTI (1918); estes são aprofundados pela restauração capitalista ocorrida na Rússia. As leis “contra a propaganda” (leia-se contra o ativismo por igualdade) homossexual assim como os casos de tortura, assassinatos e opressão promovido por grupos de extrema direita são expressões de um governo de um ex-membro da KGB, órgão de espionagem que foi deixado pelo GPU, stalinista.

Os exemplos da luta LGBTTI e suas contradições.

                A década de 60 foi um boom na luta dos setores oprimidos. Mulheres, Negrxs e LGBTTI se organizavam, com diversos grupos, coletivos e partidos políticos na luta por sua emancipação. Alguns com estratégias reformistas, outros anticapitalistas, mas todxs partem da mesma realidade internacional: acirramento da luta de classes e grandes aberturas revolucionárias.  Desde a revolução de 1917, na Rússia, se abrira ideologicamente, mas também devido a decadência do próprio capitalismo, condições reais para uma revolução socialista internacional, dirigida pelxs trabalhadorxs.
Marcado nesse contexto de efervescência ideológica e acirramento das contradições de classe, surgi a Revolta de Stonewall, marcada pela ação radicalizada dos setores LGBTTI não organizados, que não abaixaram a cabeça para a repressão policial cotidiana em um bar de Nova York. Essxs lutadorxs levantaram-se e demonstraram a força e rebeldia que carregam. Foi a faísca que possibilitou a construção de diversos movimento pela liberdade sexual e de gênero e pela luta por direitos igualitários. Na França, anos depois, se consolidaria o FHAR (Frente Homossexual de Ação Revolucionária), que apontaria a necessidade da luta LGBTTI ser encarada a partir da luta de classes e da necessidade de uma aliança com xs trabalhadorxs para a emancipação de toda a humanidade.
Mesmo com algumas conquistas em determinados países, a democracia burguesa demonstrou que as leis e os direitos conquistados em anos de luta não são perenes. Muito pelo contrário, se mantém a medida que o Estado capitalista é capaz de sustentá-los e há motivos reais para conservá-los. Não é surpresa que, em meio a crise mundial que vivemos, os primeiros direitos a serem retirados sejam os dos setores oprimidos[4].
O movimento LGBTTI brasileiro, uma grande referência mundial, não está respondendo mais às bandeiras históricas dxs LGBTTI. A sua maior representação, a ABGLT, com mais de 270 ONGs filiadas, tornou-se uma instituição de gestão de migalhas do governo de Frente Popular. Não mobiliza mais as suas bases, exceto para eventos pontuais, como as Paradas do Orgulho LGBT. Estes eventos, por sua vez, perderam o seu potencial revolucionário frente a sua constante mercantilização, orquestrada pela burguesia do Pink Money. Futuramente, poderá avaliar-se qual o grau de contribuição da ABGLT para a manutenção da alienação da comunidade LGBTTI.
Assim, é necessária uma estratégia que supere os limites da democracia burguesa e do sistema capitalista, avançando na organização dxs LGBTTI juntxs com xs trabalhadorxs. Assim destruiremos paulatinamente este Estado, extinguindo as classes sociais e os pilares das opressões, construindo assim uma nova sociedade, livre de opressão e de toda forma de exploração.

Por movimento pela livre sexualidade e construção da identidade de gênero ligado à LUTA DE CLASSES!

É emergente refletirmos sobre qual estratégia pode levar a nossa emancipação, lançando a seguinte questão: qual organização xs LGBTTI necessitam para lutar?
É importante que o movimento LGBTTI se reorganize a nível nacional e internacional, a partir de uma compreensão por dentro da luta de classes. Em uma perspectiva de organização que vá contra a ideologia consolidada em anos de neoliberalismo, de que se deve lutar ou de forma autônoma - com grupos fragmentados, cada grupo pelas suas necessidades - ou de maneira individual, por vias legais e  burocráticas. Em alternativa à institucionalização vivenciada pelo movimento LGBTTI brasileiro, é preciso retomar uma reorganização desde a base ligada a movimentos de bairro, comitês de trabalhadorxs, estudantes, organizações de esquerda, sindicatos e entidades estudantis para que nossas bandeiras sejam levantadas pelas mãos do conjunto da classe trabalhadora.
Partindo de que a LGBTfobia é uma forma mais elaborada de controle de nossos corpos e mentes, ligado à dominação de classe, não podemos simplesmente lutar por inclusão num sistema estruturado de maneira heteronormativa e cisnormativa - onde os LGBTTI são “anormalidades”).
É preponderante que sejamos linha de frente pela construção de um Movimento Pela Livre Sexualidade e Construção de Identidade de Gênero, que lutemos desde o direito a adoção aos casais homoafetivos, a despatologização dxs TRANS* e o acesso à Saúde, Educação, Trabalho e Moradia de qualidade, sem discriminação. Ligado à luta anticapitalista, para que possamos avançar juntxs em nossa emancipação real. Por isso, queremos neste encontro de Trabalhadorxs, Estudantes, Mulheres, Negrxs e LGBTTI ser parte ativa na construção de uma aliança operário-estudantil e também ligada aos setores oprimidos para que façamos emergir uma força que faça a burguesia tremer! Retomarmos os exemplos do grupo SOMOS[5] no Brasil, que se direcionou ao Estádio na Vila Euclides para saudar as greves operárias do ABC para organizarmos Stonewall desde as ruas, nas universidades, nas escolas e nos locais de trabalho contra toda a forma de opressão que sofremos.
            Para nós, a luta LGBTTI é linha de frente para nossa emancipação sexual e de nossa identidade de gênero. A Revolução é uma condição para que realmente sejamos livres para decidirmos sobre nossos corpos e mentes. Desse modo, almejamos construir um movimento  em que estejam lado a lado homossexuais e heterossexuais, homens e mulheres cis junto de travestis, transexuais, homens-trans e intersex e todxs mais. Só assim poderemos lutar pela liberdade sexual e de identidade de gênero! Pois em um mundo tão tolido de liberdades e tão limitado de potencialidades, não a quem pudesse alcançar tal liberdade!

AS BI, AS GAY, AS TRAVA E AS SAPATÃO
TÃO TUDO ORGANIZADA PRA FAZER REVOLUÇÃO!



[1] É interessante a localização de sujeitos LGBTTI que não se encaixam na estética e comportamentos “heterossexuais” em nichos de mercado, especialmente no telemarketing – onde x atendente é objetificadx em sua voz – ou em áreas mais ligadas ao estereótipo feminino – como moda, higiene e vestuário e outros setores considerados extensões do ambiente doméstico. Essa concentração dxs LGBTTI soma-se a diversas opressões, relacionadas à heteronormatividade, cissexismo e machismo, moldando condições de trabalho que são precárias e exploradoras, tendo na ausência de amparo dessxs trabalhador pelas legislações trabalhistas vigentes o seu principal marco.
[2] Travestis e transexuais são as pessoas que mais sofrem com a marginalização de suas identidades de gênero. Segundo o Núcleo de Direitos Humanos e Cidadania LGBT da UFMG (2013), 90 % dxs travestis e transexuais residentes em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, já passaram pela prostituição ou nela ainda estão para poderem pagar suas contas.
[3] Até 1979, a Organização Mundial de Saúde considerava a lesbianidade/homossexualidade como transtornos psíquicos e comportamentais, e eram codificadas como doenças. Fruto da pressão do movimento LGBTTI norte-americano e europeu, que tem como marco a Revolta de Stonewall, xs conselheirxs da OMS retiraram o CID – Códico Internacional de Doenças – relacionada à homoafetividade/homoerotismo, legitimando a alcunha “homossexualidade” – sem o sufixo “ismo”, relacionado à doença.
[4] Frente à crise econômica de 2008 e seus impactos na economia brasileira, em 2011 o governo petista cortou 300 milhões de reais do orçamento destinado ao combate ao machismo e homofobia, centralizados na Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República.
[5] Fundado em maio de 1978, o SOMOS – Grupo de Afirmação Homossexual foi a primeira organização LGBTTI do Brasil, marcando a primeira onda desse movimento no país. Composto inicialmente por mais de 20 pessoas, dentre sociais democratas até trostkistas, surgiram em resposta aos impactos de Stonewall e a efervescência político-sindical brasileira, que teve seu auge nos anos 80. Em 1979, no Dia dx Trabalhador, organizações sindicais do ABC paulista organizaram um grande ato no Estádio na Vila Euclides, com mais de 80 mil pessoas. Metade do SOMOS, composto por trabalhadorxs que estavam envolvidos nesse Ascenso sindical, propôs fazer uma intervenção nesse importante ato, o que foi rechaçada pela outra metade, por conta do medo da homofobia dxs trabalhadorxs presentes. Enquanto uma metade foi fazer piquinique, a outra partiu para o estádio, com faixas e dizeres que denunciavam a homofobia na sociedade e a solidariedade com a luta dxs trabalhadorxs. A resposta dxs presentes foi uma salva de palmas que emociona até hoje xs lutadorxs que vivenciaram essa importante aliança.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Declaração do grupo de mulheres e diversidade sexual Pão e Rosas sobre a "Cura Gay"

O PT de Dilma na contramão da luta pela garantia dos direitos das mulheres e homossexuais.

                Depois da segunda-feira histórica de 17 de junho, em que centenas de milhares foram às ruas por todo o Brasil na luta que se iniciou contra o aumento da passagem dos transportes coletivos dominados pelas empresas privadas, e que agora expande suas demandas, abriu-se uma nova situação. As manifestações demonstra um questionamento fruto da insatisfação com os governos e os partidos da burguesia – que refletiu no governo federal com uma queda de 8% da sua popularidade -, e um rechaço a casta política corrupta de conjunto, que somou-se ao repúdio a precarização das condições de vida, transporte, saúde e educação, tornando esse movimento uma caixa de ressonância das contradições da sociedade capitalista brasileira.

                Esses levantes em que a juventude cumpre um papel protagonista, não se restringem ao nosso país, e reabilitam a noção de que a luta de classes e dos oprimidos são os motores da história. Diferentemente dos movimentos Fora Collor e das Diretas Já, que haviam sido influídos por setores burgueses opositores, as manifestações hoje não conseguem ser capitalizadas pela oposição burguesa. Abrem um importante debate, que transcende a mera discussão sobre qual o partido dos ricos ganhará as eleições de 2014. Isso abre uma nova perspectiva para a luta da juventude e principalmente das mulheres, negros (as) e Lésbicas, Gays, Travestis, Transsexuais, Bissexuais e Intersex (LGTTBI), que deve ser aproveitada para que nós possamos derrubar diversos projetos e figuras reacionárias, que hoje estão atacando nossos direitos com o apoio do governo Dilma.

                Em 18 de junho enquanto centenas de milhares saiam às ruas novamente, o projeto de decreto legislativo extremamente reacionário conhecido como “Cura Gay” foi aprovado pela comissão de “Direitos Humanos e Minorias”. Essa é a gota d’água brindada pelo pastor Marcos Feliciano (Partido Social Cristão) que preside a Comissão e atua promovendo a homofobia. O “Cura Gay” quer suprimir um dos trechos da resolução do CFP (Conselho Federal de Psicologia) que proíbe os profissionais da área de participar de terapia para alterar a orientação sexual e de atribuir caráter patológico (de doença) à homossexualidade. Entendendo que a homossexualidade é uma variedade da sexualidade humana, o CFP definiu que ela não poderia ser considerada como condição patológica, o que norteou a resolução até então vigente.

 O projeto “Cura Gay” anula ainda um artigo da resolução que determinava que "os psicólogos (a favor de terapias contra a homossexualidade) não se pronunciarão nos meios de comunicação de massa, para evitar que emitam opiniões contrárias, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de desordem psíquica”. Ou seja, agora os psicólogos poderão fazer “campanha” de terapias para gays, reforçando um contexto ideológico de patologização. É um absurdo que apesar do próprio Conselho Federal de Psicologia ser contrário ao projeto, este seja votado por uma Comissão que se pretende de “Direitos Humanos e Minorias”, mas que atua contrariamente a esses pressupostos, e acumula um amplo rechaço dos setores progressistas da sociedade.  

A ala religiosa apoiadora de Dilma ataca novamente a liberdade sexual, querendo impor seus dogmas ao Estado. Ainda que o “Cura Gay” precise ser votado por outras duas comissões (de Seguridade Social e Família e de Constituição e Justiça) já se demonstra como um claro retrocesso, que não vem só. Lembremos ainda que no último dia 5/06 foi aprovado na Comissão de Finanças e Tributação a viabilidade financeira do substitutivo da deputada Solange Almeida (PMDB/RJ) do PL 478/2007, Estatuto do Nascituro, conhecido como o “Bolsa Estupro” de autoria do ex-petista Luis Bassuma (hoje PV/BA) e de Miguel Martini (PHS/MG), que já havia sido aprovado na Comissão de Seguridade Social e Família em 2010. O “Bolsa Estupro” é um projeto extremamente hediondo, que oferece à mulher estuprada a possibilidade de receber de seu violentador o pagamento de uma pensão, caso engravide como resultado da violência sofrida. Caso o estuprador não seja localizado, o Estado pagaria a pensão. Com isso se demonstra como a “garantia dos direitos do óvulo fecundado” está para estes setores acima dos direitos das mulheres. Reproduzem a moralidade reacionária de que a mulher que engravida produto de violência, ou sem ter planejado, deve “se responsabilizar” por isso. Como se já não bastasse a manutenção da proibição do aborto legal, seguro e gratuito, que fere o direito da mulher de decidir sobre o seu próprio corpo. 


                A abertura dada pelo governo de Dilma (PT) para a participação política ativa das bancadas religiosas dentro do Estado fala mais alto do que suas declarações demagógicas em favor dos oprimidos. Essa mentira de que estaríamos diante de um “governo para TODOS”, democrático, não pode mais se sustentar. O governo petista eleito sob a bandeira de defender os direitos das mulheres, dos LGTTBIs, dos negros, demonstra com suas ações como sua política é oposta, quando apoiou a figura nefasta de Marcos Feliciano para garantir em troca o apoio da bancada evangélica. Feliciano é a demonstração viva de até onde o governo Dilma pode ir em nome de seus interesses eleitorais. Afinal, está mantendo na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias uma figura que não hesita em dizer que os negros “viriam de um continente amaldiçoado” e promove a homofobia abertamente. Com isso o governo petista abre as portas do Estado para a influência da Igreja, ferindo de maneira inédita  na história recente o seu caráter laico.  
                Tanto a patologização dos LGTTBIs quanto a obrigação de conviver com estupradores colocada pelo Estatuto do Nascituro são evidencias concretas do giro à direita desse governo. Os setores oprimidos que sempre foram rifados por acordos políticos com as instituições religiosas, no Brasil ganham outro patamar com esses projetos. Nos últimos sete anos de governo petista, o assassinato de homossexuais, no país considerado como um dos mais homofóbicos do mundo aumentou em 117%. Sendo que parte importante disso é que há cinco anos, em 2008, Lula firmava o acordo Brasil-Vaticano que garante isenção fiscais para as igrejas. É o mesmo governo que vende ter criado o pleno-emprego no país, escondendo o caráter precário destes postos de trabalho, o avanço da terceirização (sendo que a maioria destes postos é preenchida pelas mulheres, pelos negros e os LGTTBIs.). A conclusão que se tem é: o governo que mais cria emprego, ainda mantém as travestis e transexuais excluídas dos mercados de trabalho. E os homossexuais ganham, graças aos aliados do petismo, o rótulo de “doentes”. 

                Não basta uma mulher no poder, principalmente quando esta se alia a setores como Marcos Feliciano. É preciso que sejamos milhares nas ruas lutando contra essa relação promíscua do Estado com as instituições religiosas. Lutando por um Estado verdadeiramente laico que possa garantir as demandas democráticas, inclusive a liberdade religiosa para todos. Enquanto nosso país está nas ruas, e que estamos diante do aniversário de 44 anos do Stonewall, quando os homossexuais enfrentaram bravamente a polícia em defesa de seus direitos, que precisamos reaver esse exemplo na luta e colocá-lo em prática hoje, contra esses projetos reacionários, que nos atacam de conjunto!
À Marcha Mundial de Mulheres (MMM), e demais setores que hoje se alinham com o governo Dilma, colocamos que é preciso romper claramente com esse governo! Só assim poderemos lançar uma ampla campanha consequente pelo: 

- Fora Feliciano e todos os membros da Comissão de Direitos Humanos e Minorias que só atuam contra nós! Abaixo Bolsonaro e Malafaia!

– Pelo arquivamento imediato do projeto da “Cura Gay”!

– Contra a violência sexual! Não à bolsa-estupro! Pelo arquivamento imediato do “Estatuto do Nascituro” (PL 478/07)!

– Pela livre determinação dos corpos! Queremos educação sexual para decidir, contraceptivos gratuitos para não abortar, aborto legal, livre, seguro e gratuito para não morrer! Queremos construir fisicamente nosso gênero, livremente!

– Anulação imediata do Acordo Brasil-Vaticano assinado por Lula em 2008!

– Separação da Igreja do Estado!

– Pela efetiva liberdade de celebração do matrimônio civil de pessoas do mesmo gênero nos cartórios!

– Pelo direito da participação de organizações de esquerda nas manifestações e suas bandeiras! É bem vindo quem quiser lutar conosco!


– Pelo fim da repressão policial às manifestações e dos processos contra aqueles que lutam!

domingo, 13 de outubro de 2013

Sobre a organização dos setores oprimidos no MML!

Escrevo um pouco mais sobre como se deu a organização do GTs no Encontro Nacional do Movimento Mulheres em Luta e a necessidade de entendermos a relação entre a política, isso é, as discussões e resoluções que definimos nestes grupos, e a forma de organização para que essas ocorram, como se influenciam, e de como o politico e o organizativo, nesse caso, estão completamente relacionados.
A divisão de GTs simultâneos que abarcavam desde temas gerais e chaves do Encontro como o debate da violência, prostituição e aborto, ocorriam ao mesmo tempo que os debates de setores duplamente oprimidos (Mulheres lésbicas, TRANS* e negras) e também o debate internacional (que discutiu os principais processos da luta de classes hoje, como Egito e Síria, que reivindico e acredito como tarefa fundamental desse encontro discutir e deliberar uma posição, para que o momento de reorganização do movimento de mulheres – sendo este encontro o maior encontro de mulheres classistas e revolucionárias nos últimos anos – esteja pautado nos processos reais 
da luta de classes).




Primeiro, me parece um equivoco que o debate sobre a questão negra, seja encarado como um debate de “mais um aspecto de opressão”, sem partir da definição de que o capitalismo brasileiro se desenvolveu em base a escravidão, a dominação dos negros e ainda mais fortemente o medo covarde da burguesia débil – como são as de país semi colonial – da grande massa negra que tinha a mesma rebeldia que os ex-escravos haitianos que fizeram a revolução. Esse é um debate que deveria estar expresso desde a conjuntura nacional, que não poderia estar desvinculada da questão negra, pois são os negros e as negras a grande maioria da população brasileira, são as massas trabalhadoras que sofrem com o racismo, que está para além da violência policial, mas que assim como apareciam nas mobilizações de Junho, eram expressões diretas da falta de moradia, da falta de educação, a reprodução da miséria que é imposta, num país miserável que nem reforma agrária nos ofereceu, como demandas da grande maioria, que são parte os negros e ainda de forma mais aguda as mulheres (lésbicas, travestis, transexuais) negras. Ainda que seja correto que haja espaço para as mulheres negras discutirem suas questões especificas (de forma que exista um espaço de organização próprio, que seja menos hostil do que os espaços abertos), o debate da questão negra não pode ser reduzido a referencia de um setor da população, mas sim encarado como uma questão nacional, uma opressão histórica e assim encarar que é tarefa de um movimento revolucionário de mulheres, compreender a centralidade que essa questão tem para a luta pela emancipação da mulher, o peso que tem nas lutas nacionais e para o conjunto de países onde a questão negra não pode ser encarada por fora de uma visão mais profunda de sua relação com a constituição do capitalismo e seu aspecto fundamental para sua derrubada.

Em relação, a questão das mulheres lésbicas e TRANS* da mesma forma que muitas organizações de esquerda reclamam de que o debate da mulher só é feito pelas mulheres, que quando falamos é a hora que nossos companheiros saem para buscar café, ir ao banheiro, preparar sua fala, e não escutam, todos esses exemplos, a organização dos setores oprimidos simultaneamente as principais discussões (e proposta de campanhas e ações) do Movimento Mulheres em Luta levou-nos a sermos as únicas a discutir nossas demandas, de forma isolada do resto do Encontro. A defesa da organização dos setores oprimidos para que estes possam se desenvolver, num terreno menos hostil e mais libertário, como protagonistas e linhas de frente de sua luta por emancipação não pode em momento algum estar em detrimento do movimento de conjunto abarcar suas demandas e ser parte de sua luta.

Mais uma vez, a discussão das mulheres TRANS* fica a parte, expressando como ainda, dentro do movimento de mulheres classistas, somos um adendo nas resoluções, não parte constitutiva e integrante do encontro. 

A auto-organização dos setores oprimidos ou a auto-organização do conjunto da classe trabalhadora em defesa dos oprimidos?


Um debate que horas parece semântico e linguístico e horas se demonstra como uma estratégia adotada por alguns grupos feministas e por hora, da própria esquerda, se expressou no movimento de mulheres, que sem dúvida, sofre pressões de muitos lados (seja a adaptação do programa para “dialogar com as massas, sem tentar ajudar na elevação da consciência”, por outro de não conseguir ligar a luta do combate as opressões com a luta pela derrubada do sistema capitalista e pela construção de uma sociedade sem Estado, sem classes sociais, sem desigualdade econômica e política).

Sem dúvida, achamos que é uma questão de principio se colocar ao lado dos setores oprimidos nas suas escolhas de organização. Achamos que é tarefa desses setores ditarem como querem se organizar e como lutarão pela sua emancipação, ainda assim, isso não significa nos abstermos do debate político e tentarmos apresentar nossas ideias para que contribua para a organização das mulheres revolucionárias em sua luta contra a exploração e a opressão que nos é imposta.

A crise econômica em que vivemos hoje demonstrou que o direito de setores oprimidos não são perenes, que ainda que tenhamos conquistado diversos avanços quando olhamos exclusivamente para a questão do gênero, quando atrelamos o caráter de classe, vemos que esses avanços não vieram sem contradição. A história do feminismo, sua evolução condizente com o tempo histórico em que a luta se pautava, nos serve para refletirmos os avanços e os limites da luta pela emancipação da mulher. Seja pela luta pela inclusão dos setores oprimidos dentro da ordem capitalista com a bandeira de igualdade, seja na elevação das diferenças problematizando a igualdade “idêntica”, a produção teórica de que maneira efetiva se luta pela emancipação da mulher e dos setores oprimidos, acabava sendo caindo entre a conquista de mais cargos públicos e políticas públicas via reformas no Estado burguês ou a constituição de uma contracultura, que propunha diversas reformas linguísticas e formas inovadoras (por vezes, corretas) de lidar com as construções de identidades, sem traçar uma estratégia de combate ao sistema capitalista rumo a um governo operário capaz de fornecer as condições materiais para se estabelecer uma igualdade não apenas nas leis e de aparência, mas na vida real.

Se demonstrou de maneira verdadeira que não se pode constituir espaços autônomos independentes do regime socioeconômico e político em que vivemos. A influência e a determinação desse sistema é involuntário e perpetua a desigualdade social. Por isso, a nossas formas de organização precisam estar ligadas com esse objetivo, de unificar a fileira dos trabalhadores, construir uma sensibilidade pró-operária entre os oprimidos combinado a constituir uma sensibilidade entre os operários das bandeiras dos setores oprimidos da sociedade como as mulheres, LGBTs e negros e negras, assim buscando que a classe trabalhadora seja capaz de hegemonizar os demais setores da sociedade, a partir de carregar suas bandeiras em suas mãos, para fortalecer nosso campo revolucionário para a tomada do poder.

O Encontro resgatou diversas mulheres revolucionárias: Rosa Luxemburgo, Clara Zektin, Dandara, Flora Tristan, entre outras, que também faziam um debate sobre a organização das mulheres, em partidos políticos, no SOVIETs, na linha de frente da luta revolucionária, da luta contra o machismo, etc.
Os debates sobre conjuntura nacional e internacional, assim como o aprofundamento dos processos revolucionários em curso, nunca foram secundarizados na organização das mulheres, pelo contrário, eram espaços privilegiados pois colocavam as mulheres na linha de frente de uma reflexão estratégica, dos avanços e limites dos processos e na busca por encontrar saídas e inclusive aprendizado com a luta dos trabalhadores. Resgato isso para dizer, que o caráter simultâneo dos GTs que aprofundavam a visão da Primavera Árabe, os GTs de setores oprimidos e os debates centrais do encontro que inclusive eram deliberativos, se colocavam contra um método revolucionário de que as mulheres se apropriem da reflexão estratégica e os ensinamentos que os processos da luta de classes como Egito e Síria nos trazem, assim como os setores oprimidos organizados nesse momento, partem de não só departamentalizarem sua luta, mas também de estarem marginalizados dentro do próprio encontro (sem que nossas demandas ecoassem dentro dos principais foruns de discussão e impedindo diretamente que opinássemos nas principais resoluções como o debate da violência, que é parte fundamental de nossa opressão, uma vez que somos nós, as TRANS* que temos a perspectiva de vida de apenas 35 anos, no país mais homofobico do mundo).

Por isso, nesse debate tentamos esclarecer ao máximo, que defender espaços privilegiados de discussão entre setores oprimidos não pode estar em contradição, nem pode nos deixar menos convencidas de colocar, que é preciso nos auto-organizarmos junto a classe trabalhadora, por isso é nossa tarefa exigir que os sindicatos e as entidades estudantis tomem em suas mãos, as bandeiras das mulheres lésbicas, das travestis e das transexuais. Nossa luta é anticapitalista, pois é nesse sistema que estamos entregues a prostituição como única forma de subsistência, que estamos jogadas a violência (verbal, física e psicológica) cotidiana, a perseguição de grupos transfobicos, da própria polícia assassina e genocida com o povo negro e com as TRANS* e sem a acesso a serviços públicos mínimos como saúde, educação, moradia, etc.

Nossa luta é contra os grandes capitalistas que lucram milhões com o nosso trafico sexual, com os silicones industriais que nos matam, com clinicas clandestinas que realizam aborto e também a cirurgias para construirmos nossos gêneros, que lucram milhões com os hormônios e as pílulas de anticoncepcionais colocando nossos direitos a venda. Nossos inimigos são os mesmos de toda a classe operária, entretanto, não podemos nos iludir de que não é necessário dar um serio e profundo combate na ideologia burguesa que contaminou a classe trabalhadora, principalmente nos últimos 30 anos, onde conseguiu consolidar sua história de “fim da classe operária” e “vitória do capitalismo”, pós derrubada do muro de Berlim.

Atuamos num movimento classista e revolucionário, porque não acreditamos como muitos movimentos feministas acabaram por "descobrir" que nossa luta seja contra os homens ou como algumas transfeministas acreditam "contra as mulheres CIS (mil aspas no termo Cis"), pelo contrário. Achamos que a aliança entre os homens trabalhadores (também brancos e heterossexuais) com as mulheres """"CIS"""" e demais setores oprimidos não só são importantes, como extremamente necessários para colocar abaixo essa sociedade que nos oprime e divide. Atuamos nesse movimento porque não vemos o combate ao capitalismo separado do combate as opressões. Tampouco temos uma estratégia de que cada grupo autonomamente lute por sua emancipação, mas exatamente o contrário, sozinhas, podemos ser poucas, no encontro eramos no máximo em 10 mulheres TRANS*, mas juntas eramos um movimento real e forte com a presença de mais de duas mil mulheres.

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Por fim, essa é uma crítica para avançarmos de conjunto na organização dos próximos Encontros Nacionais e também aprofundarmos um debate com o conjunto dos movimentos de esquerda e de setores oprimidos sobre como forjar uma real aliança na luta contra nossos inimigos em comum.

                Ao construirmos um movimento de mulheres revolucionário e classista, precisamos entender que os elementos organizativos (como por exemplos, as mesas de discussão e os grupos de trabalho) não podem ser pensados por fora de seus objetivos políticos e para assim garantir a melhor forma (mais democrática e qualitativa) possível a elaboração de um plano de lutas que nos arme para o próximo período.

É preciso que exista fóruns permanentes de discussões entre setores oprimidos, para que nos organizemos e elaboremos nossas demandas, que possamos trocar informações e constituir uma relação mais próxima entre nós. Por outro lado, é fundamental que nesses encontros não se expresse uma departamentalização das discussões, que inclusive os setores oprimidos sejam protagonistas de se reunirem, e não GTs específicos para estes (que parece as vezes até um “organização forjada”) e que de forma mais democrática, os debates mais profundos e teóricos sobre os processos revolucionários em curso possam ser debatidos com o conjunto do Encontro e que as TRANS*, desde onde falo, possamos não apenas ser linha de frente de nossa opressão (o que já nos damos a tarefa), mas que sejamos dirigentes revolucionárias, queremos ser protagonistas da luta contra essa sociedade de miséria, opressão e exploração, queremos ser linha de frente da abolição de tal modo de produção, queremos ser mulheres que lutam contra toda essa podridão e responsáveis por colocar de pé uma nova sociedade.

Nós, mulheres TRANS* queremos tomar o céu por assalto. Queremos ser linha de frente da transformação radical dessa sociedade. Na nossa luta por emancipação, a revolução é uma condição, que não abrimos mão!