segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Pão e Rosas também é sobre lésbicas, gays e mineiros


Por: Virgínia Guitzel


Neste domingo, 08 de Fevereiro, ocorreu o segundo dia do Acampamento Nacional da Juventude ÀS RUAS onde assistimos o filme Orgulho, que retrata a história do grupo de lésbicas e gays em apoio aos mineiros (LGSM, sigla em inglês) contra a polícia, a mídia e a poderosa Margaret Thatcher. Um filme sem previsão a chegada as grandes telas brasileiras e já recebido com censuras no Estados Unidos traz uma imensa lição para o movimento LGBT internacional e um caminho a ser retomado.

Com uma linguagem hollywoodiana, muito didática e simples de entender, o filme chega a milhares de pessoas resgatando uma moral confrontando os longos anos de restauração burguesa que estivemos submetidos até a inflexão do surgimento da Primavera Árabe em 2011. Exibe os preconceitos da comunidade LGBT e dos mineiros britânicos e como essa aliança foi capaz de superá-los na medida em que fortaleceu a luta dos trabalhadores e na própria organização do movimento contra a homofobia e a transfobia resultando numa importante delegação de mineiros na marcha do Orgulho Gay em 1985.

Os fios de continuidade que ligam as mulheres, os LGBT à classe trabalhadora

A aproximação da LGSM ao movimento de trabalhadores está verdadeiramente retratada no filme através da profunda relação entre o movimento LGBT e o movimento de mulheres. São as esposas, filhas, avós, mães e irmãs dos mineiros que organizadas em uma Comissão de apoio abriu a possibilidade para que essa experiência marcasse a história, transformando numa grande lição de como essa aliança revolucionária entre os que mais sofrem com o capitalismo (com a repressão policial e estatal, com a mídia burguesa moralista) e a classe que tudo produz (e só pode conquistar suas verdadeiras reivindicações de libertação com a derrubada da burguesia) pode superar toda a ideologia burguesa homofobica, transfobica e machista.

Sem dúvidas uma das cenas mais bonitas do filme é quando as mulheres se levantam após um discurso de Mark, lider da LGSM, de apoio aos mineiros e suas vozes vão se somando na canção do Pão e Rosas.



É nessa hora que o filme demonstra toda sua potencialidade em dar a voz e a história tão cara e tão brutalmente escondida pelos longos anos do neoliberalismo aos setores mais oprimidos da sociedade. São as mulheres reais, mães, avós, esposas, irmãs e filhas que neste processo de greve se colocam num profundo movimento que avança a consciência de sua condição de opressão, contribuindo para o avançar da consciência do conjunto dos grevistas, que também se levantam por respeito a canção e seu profundo significado, da luta anticapitalista e antiopressão pelo direito do Pão, mas também das rosas.

As mulheres, os LGBT e os mineiros protagonizam o filme que não chama Orgulho a toa, mas carrega consigo o verdadeiro significado deste título que nomeou todas as marchas gays do mundo e segue sendo uma importante política de auto-afirmação. Chama-se orgulho, porque é deste ponto de vista moral e combatente, que as mulheres e os LGBT se colocam ao lado do trabalhadores com uma clareza natural dos inimigos em comum que possuem e a força que essa solidariedade traz para ambos.

A identificação das mulheres com os LGBT é surpreendente para ambos. Em um diálogo do filme, uma das mulheres da Comissão, Gail, pergunta para dois homens homossexuais "Então, vocês vivem juntos, você sabe, como marido e mulher? Mas o que isso quer dizer?". Os dois se olham acreditando se tratar uma pergunta sobre sua sexualidade, então, Gail demonstra qual sua verdadeira preocupação: "Qual dos dois faz o trabalho doméstico?". Outro momento do filme que encanta por sua sutileza, é a radical e profunda transformação que as mulheres conquistam em debater sua sexualidade e seus desejos ao encontrarem brinquedos e revistas pornos no quarto de um dos LGBT. São debates que explodem entre a Comissão de Mulheres e os LGBT que combinados a luta heróica dos mineiros abrem um novo horizonte para pensarmos a transformação da humanidade.

Construir uma juventude revolucionária que luta pelo Pão e as Rosas

A luta contra as opressões sempre foi uma marca da juventude ÀS RUAS onde estivemos presentes em todos os atos em exigência a justiça e punição para os assassinatos de Kaique, João Donati, Geia Borghi, Marcos Vinicius entre tantos outros. Participamos de Encontros e pautamos diariamente em nossos locais de estudo, de trabalho, como faremos novamente nessas ingressadas de 2015 a tão importante discussão contra o machismo, a homofobia e transfobia. No ano passado, estivemos na linha de frente de uma importante greve das três universidades estaduais paulistas e pudemos resgatar a tradição que reivindicamos de aliança com os trabalhadores e marchamos no ato por justiça a João Donati junto com uma comissão de trabalhadores da Universidade de São Paulo votada em seu comando de greve à levar solidariedade ao movimento LGBT e a familia da vítima.

Antes de acabar o ano, os metroviários de São Paulo impulsionaram uma campanha que emocionou milhares de pessoas que receberam os gritos contra a homofobia nos vagões onde tantos casos de agressões foram já noticiados, como o caso do metroviário Danilo e seu companheiro que deram origem a campanha. Pouco antes do Natal, o governo Alckmin demitiu novamente os metroviários que fizeram uma importante greve reivindicando a luta da juventude em Junho e um transporte de qualidade, gratuito para toda a população.

Por isso, nós da Juventude seguimos a campanha pela reintegração de todos os 40 metroviários demitidos e a luz do filme acreditamos que para fortalecer o movimento LGBT e o movimento de mulheres que hoje passa por muitos obstáculos, começando pelo novo Presidente da Câmara autor da cura gay e contrário ao direito ao aborto, é fundamental que as lésbicas, gay, bissexuais e travetis, transexuais, homens-trans e pessoas não binárias encontrem em retribuir o apoio dos metroviários um caminho para fortalecer seu movimento buscando o setor da sociedade que carrega consigo o potencial de transformar radicalmente a sociedade. Somente numa campanha viva e decidida em apoio aos trabalhadores será possível a reconstrução do laço tão apaixonante demonstrado pelo filme, que é a única alternativa para que as lutas de hoje sejam o prelúdio dos debates e das tarefas que nos levem a nossa verdadeira emancipação completa, no dia de amanhã.


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